quarta-feira, 28 de dezembro de 2016

2850 - O REGRESSO

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 O REGRESSO (THE REVENANT, USA 2015) – Ok, Leonardo DiCaprio finalmente ganhou, merecidamente, o Oscar de Melhor Ator com este personagem, Hugh Glass - mutilado por um urso e deixado à morte, sem armas nem provisões - mas a grande estrela do filme é a Fotografia do virtuose Emmanuel Lubeski. Em tomadas longuíssimas, sempre obtidas com luz natural, as cenas, tão imersas na vida primitiva e no mundo crudelíssimo em que os personagens interagem (ou seria melhor dizer, se trucidam?), vão tomando conta de nossa alma, à medida em que Glass se arrasta pelas planícies geladas, agarrando-se ao mais tênue fio de vida que pode encontrar, a fim de realizar um dos instintos mais básicos do ser humano: a vingança. Tirante a pouca originalidade do roteiro (que, diga-se, não atrapalha em nada o filme como um todo), o que é realmente admirável é o controle absoluto da técnica cinematográfica que Alejandro G. Iñarritu demonstra, ao trazer a natureza de forma tão realista ao espectador e manejar a câmera e seus múltiplos pontos de vista, reproduzindo o atordoamento e a desorientação de quem está dentro de uma batalha ou atacado por um animal selvagem. A maestria técnica deste mexicano (já exibida em BIRDMAN) impressiona pela forma segura de contar uma história em perfeito equilíbrio com seus personagens, mesmo que o principal deles seja a pura e simples manifestação dos elementos da natureza.  

terça-feira, 27 de dezembro de 2016

2849 - ROGUE ONE, UMA HISTÓRIA DE STAR WARS

ROGUE ONE: UMA HISTÓRIA DE STAR WARS (ROGUE ONE, USA 2016) – Tudo, bem, tem DNA de Star Wars, só que não, né? ROGUE ONE, numa avaliação mais aprofundada, tem jeito de piloto de seriado, o que, quando comparado com o DESPERTAR DA FORÇA, se transforma numa experiência não exatamente decepcionante, mas que provoca uma sensação de relativa insatisfação para quem entende – e sente – o universo de Star Wars como algo além do anímico. ROGUE ONE é uma prequela do episódio IV – UMA NOVA ESPERANÇA – o “kick-start” da trilogia inicial, que devia muito do seu charme por começar justamente pela quarta edição, já que esta ruptura temporal provocava um deslumbramento hipnótico que vem durando desde então, quando se menciona Star Wars. Excluam-se desta afirmação os Episódios I, II e III, diga-se de passagem, todos muito ruins. Acontece que ROGUE ONE não tem a mistura de nostalgia e novidade em doses equilibradíssimas que se viu em O DESPERTAR DA FORÇA que, além de nos trazer de volta personagens icônicos e um roteiro arrebatador, era cinema de verdade, com senso de escala e de espetáculo. Era, enfim, digno de perfilar entre os filmes canônicos da série. É claro que RO não se propõe a ser um marco na história de Star Wars, com a envergadura dramática do filme anterior, embora seja tão sombrio, que nem todos os sabres de luz enfileirados poderiam iluminar. Faz sentido se entendermos que é uma ramificação da história principal, mas, aqui, alguns problemas causaram um distúrbio na Força. Os personagens só pegam no tranco, mesmo assim não se sustentam no decorrer da trama. Donnie Yen e Wen Jiang, como guardiões do templo Jedi, foram os que mais impressionaram positivamente. Mads Mikkelsen mostra a competência de sempre como pai da protagonista Jyn Erso e projetista a Estrela da Morte, embora fique pouco em cena. Forest Whitaker, como o líder extremista Saw Gerrera, faz um bom trabalho, apesar do exíguo tempo que lhe foi dado. E Peter Cushing, mesmo em CGI, é muito mais carismático e talentoso que muitos atores que se esforçam, mas não dão conta do recado, como a protagonista Felicity Jones e seu par, Diego Luna, todos meio sem força, se me perdoam o trocadilho. E o que dizer do paupérrimo CG que reproduz a Princesa Leia como se fosse uma Barbie com problemas hepáticos? A grande questão, a meu ver, é a escolha do diretor Gareth Edwards que, até então, só tinha dois longas no currículo: MONSTROS, de 2010, que é maravilhoso, e GODZILLA, de 2014, que é um desastre. Convenhamos, não se pode colocar na direção de um filme de uma franquia tão forte (embora, como já foi dito, ROGUE ONE seja um filme aquém das expectativas) um sujeito com tão pouca experiência, que claramente se intimidou ao lidar com um universo tão rico e impactante. Ou seja, não há em ROGUE ONE aquilo que STAR WARS é capaz nos seus melhores momentos, que é um mix de emoção, deslumbramento, inquietação e respeito, tudo o que se abate sobre nós ao primeiro acorde da memorável trilha de John Williams, enquanto os já famosos letreiros iniciais nos situam no tempo e no espaço. Letreiros que, por sinal, não estão, pela primeira vez, num filme desta série que aprendemos a amar, sem entender nem desistir, pois a Força, uma vez sentida, estará sempre conosco, não é Gabriel?

segunda-feira, 26 de dezembro de 2016

2848 - PEGANDO FOGO

PEGANDO FOGO (BURNT, USA 2015) – Apesar de o título em português sugerir uma certa picardia, o que tempera esta história é um drama profissional/existencial vivido por Adam Jones (Bradley Cooper), um chef que, após se envolver com álcool e outras drogas, resolve resgatar o que ainda resta de sua reputação no circuito culinário de Londres. No início, não dá muito para imaginar Cooper no papel de um cozinheiro, mas, à medida em que ele vai encarando o desafio de enfrentar a depressão, para voltar aos tempos de glória, vê-se que ele é realmente um bom ator e que cresce dramaticamente quando encontra um bom personagem. Assim é seu Adam Jones que, apesar de conter laivos de estereótipos de histórias de restaurante (rivalidade com o dono de outra casa, a responsabilidade diante da visita inesperada dos membros da Michelin e previsíveis ataques de pelanca), se torna um personagem denso e crível, dentro de suas limitações humanas. BURNT é um filme sobre obsessão e autoconfiança, que traz uma visão bem acurada do que pode ser a rotina estressante da cozinha de um restaurante sofisticado e que, se visto com pouca expectativa, pode ser degustado entre uma ou outra xícara de café. Ou chá, pois estamos em Londres.   

2847 - O NEGOCIADOR

     
O NEGOCIADOR (THE NEGOTIATOR, USA 1998) – Há uma conspiração no ar, no que tange o fundo de pensão dos policiais de Chicago. Um dos detetives desconfia da armação e procura seu melhor amigo, o também detetive Danny Roman (Samuel l. Jackson), mas é assassinado enquanto o esperava. As suspeitas, claro, caem sobre Roman que, invertendo sua prática profissional, mantém como refém uma equipe da polícia, no seu prédio-sede, para tentar provar sua inocência. Um pouco longo demais (2h20min), o filme possui um ritmo interessante, principalmente na sua primeira metade, mas cai consideravelmente quando vai se aproximando do epílogo. Samuel L. Jackson faz bem o personagem injustiçado, mas fica um pouco aquém da dramaticidade que um ator do porte de Denzel Washington, por exemplo, poderia dar ao atormentado Roman. Kevin Spacey aparece como o contraponto do protagonista, numa atuação contida e eficaz, especialmente por causa de sua forma minimalista de atuar. Menos é realmente mais. O maravilhoso Paul Giamatti é um dos reféns – é interessante vê-lo atuar antes da fama de ator cult que adquirirá depois. Como trívia televisiva, atenção para Michael Cudlitz, um sniper no filme: mais de uma década depois, ele será o simpático Abraham, de THE WALKING DEAD.  

segunda-feira, 19 de dezembro de 2016

2846 - NARCOS, SEGUNDA TEMPORADA


NARCOS, A SEGUNDA TEMPORADA (USA, 2016) – A segunda temporada de NARCOS mantém a tensão de uma história que extrai parte de sua força da decupagem crua da violência que, assim, redobra a brutalidade. O cerco a Escobar se intensifica, na medida em que a litragem de sangue se esparrama em território colombiano. Se Wagner Moura continua no limite da caricatura, temos a ascensão dramática do agente da DEA Javier Peña (o extraordinário Pedro Pascal), que faz alguns acordos muito duvidosos na tentativa de capturar o traficante – e que termina esta temporada despontando como o protagonista natural da próxima (a Netflix já confirmou a terceira e a quarta temporadas). A série mostra como seria o mundo pós-Escobar, o vácuo deixado pela derrocada dele e como o poderoso cartel de Medellin passa a ser preenchido pelos cartéis de outra cidade, Cali.

sábado, 17 de dezembro de 2016

2845 - UM SENHOR ESTAGIÁRIO

UM SENHOR ESTAGIÁRIO (THE INTERN, USA 2015) Este é um filme que nos encanta, principalmente pela atuação contida, suave e charmosa de Robert DeNiro, no papel de um estagiário de 70 anos que ingressa numa empresa moderninha que, por motivos institucionais, tem que contratar pessoas nesta faixa de idade. A primeira parte vai muito bem, com DeNiro conquistando, com sua simpatia e experiência, os colegas de trabalho e a chefe workaholic, vivida com classe por Anne Hathaway. A premissa do roteiro é muito boa, já que explora com delicadeza os conflitos que aparecem quando duas gerações passam a conviver num ambiente de espaço restrito, como um escritório. Neste aspecto, o filme vai muito bem. Acontece que, na segunda parte do filme, insere-se um elemento dramático na vida conjugal da protagonista que em nada ajuda no aprofundamento da história. Esta crise, na parte final, é resolvida graças a uma intervenção “Deus Ex-Machina” que põe quase tudo a perder. DeNiro volta a ser um grande ator, ao fazer de um personagem irrealisticamente perfeito uma daquelas pessoas que gostaríamos de ter por perto, nos bons e maus momentos.   

quinta-feira, 15 de dezembro de 2016

2844 - DEADPOOL

1.      DEADPOOL (DEADPOOL, USA/Canadá, 2016) – A arte do deboche e da autodepreciação tem sua expressão máxima no atrevido, exuberante e totalmente divertido filme em que Ryan Reynolds finalmente encontra um personagem que tem tudo a ver com sua carreira ciclotímica – não é à toa que, em várias cenas, ele, Reynolds, passa a ser referência escrachada das melhores gags do roteiro. É o pináculo do politicamente incorreto, sem preocupações com o que possa, eventualmente, ser entendido como mal gosto ou um sacrilégio ao panteão dos super-heróis. No entanto, tudo funciona, mesmo o vilão mal elaborado, a única nota dissonante do filme. No mais, Reynolds encontra finalmente o tom certo para o seu jeito de rapaz honesto sob uma capa de safadeza, e Morena Baccarin, muito bonita mesmo, enfeita com talento a vida amorosa de um super-herói que está a anos-luz do chatíssimo bom mocismo do Capitão América, por exemplo. 😊

segunda-feira, 5 de dezembro de 2016

2843 - ÁGUAS RASAS

ÁGUAS RASAS (THE SHALLOWS, USA 2016) – A primeira cena é arrebatadora: uma praia deslumbrante, uma baía pequena e ensolarada, com ondas azuis sobre corais e areia branca. Aí, começa um roteiro meio óbvio: uma moça bonita (Blake Lively, nem tão bela assim, nem tão “lively” assim) chega sozinha, com a intenção simples de surfar e ser feliz. Não há ninguém à vista, já é tarde e logo vai escurecer. Mas ela insiste em dar mais umas braçadas, pegar a onda derradeira. E, então, acontece o problema: ela invade o território de um tubarão-branco que, naquele momento, faz a festa com uma baleia recém-atacada pelo próprio, e passa a ser sua presa preferencial. Aí que o roteiro escorrega: dificilmente um tubarão deixaria de se deliciar com uma baleia inteira à sua disposição, para nadar atrás de uma jovem magrela e, convenhamos, sem sal (Ryan Reynolds que me perdoe, mas já chegara ao pináculo que todo ser humano, de qualquer gênero, poderia almejar, quando se casou com Scarlett Johansson). Apesar de o filme se manter com certa dignidade, não dá para não comparar com o genial JAWS, de Spielberg. Além do mais, um tubarão em CGI não convence nem os mais crédulos. Vale pela serenidade que a protagonista mostra diante do perigo e uma racionalidade nos meios de enfrentá-lo.

2842 - DOIS CARAS LEGAIS

DOIS CARAS LEGAIS (THE NICE GUYS, USA 2016) Russel Crowe e Ryan Gosling são dois detetives esculachados que, numa Los Angeles dos anos 70, se unem para resolver o mistério da morte de uma atriz pornô. O filme é uma bagunça colorida das obsessões mais populares desta estranha década espalhafatosa, como o hedonismo californiano, o mercado da pornografia e a proliferação das drogas urbanas, que vinham revestidas de glamour e status social. Crowe, como o fortão de aluguel, e Gosling, como seu parceiro medroso, descobrem uma química efervescente e estão em sintonia desde a primeira cena desta comédia com roteiro meio confuso, mas deliciosamente simpática, como as produções que retratam uma época em que todo mundo se achava esperto. Acaba sendo um pastelão “noir” que funciona, sobretudo por causa da sua dupla de protagonistas.

terça-feira, 29 de novembro de 2016

2841 - KRAMER VS KRAMER

1.      KRAMER VS KRAMER (USA, 1979) – A cena inicial, com Meryl Streep se despedindo do filho, meio em dúvida se iria mesmo embora ou não, em silêncio, dando a dimensão exata do seu sofrimento, da dúvida sobre as razões da sua atitude, é emocionante. Aos 30 anos, já era uma estupenda atriz. Dustin Lee Hoffman, o marido deixado, reagindo, sem falar nada, à partida da mulher, até esboçar uma reação, entrega uma das mais memoráveis sequências iniciais da sétima arte. A partir daí, vê-se a reconstrução da relação com o filho pequeno que, a princípio, não entende a partida da mãe e a inabilidade inicial do pai para gerenciar o universo doméstico subitamente descoberto. Hoffman brilha com silêncios emocionantes com o filho, no processo de descoberta mútua, e na forma como lida com os sentimentos que ainda tem pela ex-esposa. K vs K é um dos inúmeros filmes dos anos 80 sobre divórcio e disputas em tribunais, como O CAMPEÃO, GENTE COMO A GENTE e A GUERRA DOS ROSES.    

domingo, 27 de novembro de 2016

2840 - TUBARÃO

TUBARÃO (JAWS, USA 1975) O filme que lançou Steven Allan Spielberg ao panteão dos maiores diretores de todos os tempos ainda é uma aula de cinema em vários sentidos: da técnica arrojada e inovadora que deu vida ao grande tubarão branco à escolha acertada do elenco e, sobretudo, do roteiro inteligente à música hipnótica de John Williams, que acabou virando sinônimo do ingente sucesso desta produção repleta de problemas técnicos, cuja solução acabou sendo a marca registrada da genialidade do padrinho de Gwyneth Paltrow. De fato, foi o fracasso do funcionamento do tubarão mecânico, quando colocado na água salgada, que fez Spielberg apenas sugerir sua presença ameaçadora, até o clímax memorável. Roy Scheider, Richard Dreyfuss e Robert Shaw estão perfeitos. Shaw, principalmente, brilha quando faz um monólogo a bordo do Orca, relembrando sua experiência na guerra – um dos momentos mais emocionantes do filme.   

terça-feira, 15 de novembro de 2016

2839 - ALIANÇA DO CRIME

ALIANÇA DO CRIME (BLACK MASS, USA 2015) Aqui temos Johnny Depp buscando a retomada da carreira com um personagem verídico, mas a direção fraca de Scott Cooper não ajuda em nada. Os muitos close-ups do pai de Jack Sparrow acabam sendo apenas um registro contínuo e sem sentido da maquiagem que procura torná-lo parecido com James “Whitey” Bulger, o senhor do crime em Boston, na década de 70. A história de gangsteres em centros urbanos americanos poderia ter sido muito melhor explorada por um diretor do porte de Martin Scorsese, como o próprio já mostrou em OS BONS COMPANHEIROS, CASSINO e OS INFILTRADOS. De certa forma, Cooper dirige o filme, como um motorista que recém tirou carteira de habilitação dirigira uma Ferrari, retratando o terror, mas fugindo da controvérsia e, assim, levando o roteiro passivamente e com total ausência de paixão. Depp se entrega ao papel e convence como um personagem manipulador, capaz de assassinar os inimigos à queima-roupa e também jogar cartas com a mãe idosa e o irmão (o grandíssimo Benedict Cumberbatch).  

domingo, 13 de novembro de 2016

2838 - JOE

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JOE (JOE, USA, 2013) – Um ex-presidiário, Joe (Nicolas Cage, talvez no melhor papel de sua carreira), que pode ser considerado o pior modelo de cidadão, faz amizade com um menino de 15 anos, Gary (Tye Sheridan, do ótimo MUD) e, juntos, começam a percorrer uma estrada que leva a importantes escolhas entre a redenção definitiva e a ruína total. Pesado, violento, deprimente, JOE é um daqueles filmes que provavelmente não iremos assistir novamente, mas que marca a alma por mostrar a vida sem glamour, com suas dores e violências intrínsecas, na qual a grande esperança é apenas continuar vivo num ambiente deserto de bons sentimentos. Talvez seja exatamente por isso que a amizade simbólica entre Joe e Gary seja o eixo central desta história passada numa parte dos EUA que mais parece a pior favela de um canto esquecido do terceiro mundo. Destaque para a atuação dos dois protagonistas, especialmente Cage que, com este papel, prova de uma vez por todas que sempre foi um grande ator, capaz de transformar uma história banal num contundente motivo para reflexão, especialmente para quem teve coragem de ir até o último fotograma.

2837 - 11.22.63

  11.22.63 (USA, 2016) – Um professor de literatura (James Franco) descobre um portal de tempo que o leva a Dallas, em 1960, e tenta impedir o assassinato de Kennedy. Esta premissa, por si só, tornaria esta série imperdível. Mas, além de tudo, o roteiro é bem construído e o elenco, a começar por Franco e pelo excelente Chris Cooper, é mais que um auxílio luxuoso. É impressionante como as histórias sobre viagens no tempo fascinam o público, desde a época em que Tony e Doug se perdiam nas espirais cronológicas de O TÚNEL DO TEMPO. Neste caso, especialmente para mim, ver como seria voltar para o início da década de 60 e desvendar o mistério que envolve o assassinato de JFK, é como realizar um sonho de uma vida inteira. Cada episódio é muito bem elaborado e mostra, com bom humor, na maioria das vezes, os conflitos morais que o personagem de Franco enfrenta, bem como as implicações de tentar mudar o futuro. A série é baseada num livro de Stephen King e tem a produção de J.J. Abrams. Uma das melhores produções do ano.

terça-feira, 8 de novembro de 2016

2836 - AURA

AURA (EL AURA, Argentina, 2005) Mais outro esplêndido exemplar do excelso cinema argentino, tendo como protagonista o maior de todos os atores portenhos – Ricardo Darín que, neste filme noir, brilha como um taxidermista epilético (sim, isso tem a ver com o roteiro) que sempre imaginou um plano perfeito para roubar um banco e que acaba no meio de uma história em pode pôr em prática todas as suas teorias. Todos os elementos do noir estão lá: a bela e misteriosa mulher, assassinatos, o jogo do claro-escuro, as atuações ambíguas, o herói que se deixa levar pelos fatos. O grande diretor Fabián Bielinski (responsável pelo também ótimo NOVE RAINHAS e que lamentavelmente morreu no Brasil em 2006, quando promovia o filme) explora muito bem o viés nacionalista do cinema argentino, mostrando os costumes e a filosofia de vida do país. Atenção para a cena em que Darín explica o que sente depois dos ataques epiléticos – fina conjunção entre uma magistral atuação de um ator singular e a direção sensível a serviço do que o cinema pode mostrar de melhor.     

quarta-feira, 2 de novembro de 2016

2835 - OS ÚLTIMOS DA TERRA


OS ÚLTIMOS DA TERRA (Z FOR ZACHARIAH, USA 2015) Esse é um filme pequeno, quase um “pocket movie”, a começar pelo elenco composto de três atores apenas e um roteiro inesperado: depois de uma hecatombe radiativa que dizimou quase toda a humanidade, sobraram três sobreviventes: um cientista (Chiwetel Ejiofor, sensacional, como sempre), um mineiro meio bronco (Chris Pine, na medida certa para um personagem-chave para a história) e a última mulher na face da Terra, a bela Margot Robbie. O triângulo amoroso acontece entre eles, deixando uma sugestão de manipulação sexual que nos remete a uma Capitu improvável entre Bentinho e Escobar. A fotografia bucólica – excelente, por sinal – se mistura a uma história de ficção científica meio descaracterizada, com conflitos éticos, étnicos e religiosos apresentados de modo sutil, mas extremamente pertinentes ao roteiro. De qualquer forma, ficamos com a impressão de que a presença de uma mulher (linda, no caso), num mundo pós-apocalíptico, disputada por dois homens, pode ser um elemento disruptivo na instauração de um recomeço social e ético.   

sexta-feira, 28 de outubro de 2016

2834 - THE WALKING DEAD - SEXTA TEMPORADA

THE WALKING DEAD – SEXTA TEMPORADA (USA 2015) – Esta foi uma das temporadas mais sangrentas de TWD. É curioso notar que os atores parecem mesmo estar vivenciando intensamente as experiências de seus personagens, tal a forma como as emoções ficam estampadas em seus rostos. Um dos episódios mais legais desta temporada é aquele em que Morgan (o excepcional Lennie James) conta como aprendeu sua filosofia de preservar a vida a todo custo, depois de um encontro inusitado com Eastman (John Carroll Lynch, estupendo). No mais, o desfecho da temporada trouxe uma das cenas mais tensas de toda a história – com o aparecimento de Negan (Jeffrey Dean Morgan) diante de todo o grupo ajoelhado e ameaçado de morte. A direção é excepcional, além, claro, das emocionantes atuações de todo o elenco. 

2833 - O ENIGMA DE OUTRO MUNDO

O ENIGMA DE OUTRO MUNDO (THE THING, USA 2011) - A trama se passa dias antes da história do longa de 1982, já um clássico de John Carpenter (que por sua vez refilmou O Monstro do Ártico, de 1951, baseado no conto "Who Goes There?", de John W. Campbell Jr.). Mary Elizabeth Winstead faz a paleontóloga Kate Lloyd, chamada para investigar a descoberta de uma nave alienígena perto de uma base norueguesa na Antártica. O alien congelado é desencavado, desperta e, como se espera, provoca gritos, pânico, até que a equipe descobre que ele absorve e imita humanos. A partir daí, nada de novo continua a acontecer. O filme transcorre de maneira mecânica, como o arsenal de prostéticos e CGIs que mostram e dissecam os aliens nos mínimos detalhes, mas sem alma.

sexta-feira, 21 de outubro de 2016

2832 - UM HOMEM ENTRE GIGANTES

UM HOMEM ENTRE GIGANTES (CONCUSSION, USA 2015) - Apesar de transmitir a mensagem sobre os problemas de saúde que o futebol americano pode causar, falta brilho na condução do diretor Peter Lendesman, que opta por várias subtramas ao invés de investir em um ponto de real importância - as concussões e os problemas causados pelas colisões em cabeças dos jogadores. O estudo realizado por Bennet Omalu (Will Smith, sóbrio e bem no papel) mudou as regras e a história do esporte. Além disso, envolveu grandes nomes políticos e diversas empresas interessadas no campeonato, um dos mais lucrativos do mundo. Percebe-se, depois do arrefecimento da emoção de ver o triste destino destes atletas, que o roteiro é meio irregular, meio perdido em subtramas fracas dramaticamente – por exemplo, o romance de Omalu não decola, e fica meio apressado o processo de amizade dele com o médico Julian Bailes (Alex Baldwin, numa atuação muito boa). De qualquer forma, a história de Omalu mostra como pode ser perverso, injusto e violento um sistema econômico que não se importa em sacrificar vidas por causa do lucro. Os fatos do filme levam a uma reflexão sobre determinados “esportes” carniceiros, como o UFC, nos quais os “atletas” podem ter os mesmos problemas no cérebro em função das pancadas na cabeça, supondo-se que, evidentemente, haja, nestes “atletas”, algum cérebro para ser lesionado.


 

quarta-feira, 12 de outubro de 2016

2831 - OS 33

OS 33 (THE 33, USA/CHILE, 2015) – A diretora mexicana Patricia Riggen perdeu uma boa oportunidade para fazer um filme que, apesar de todos os clichês que a história proporciona, teria tudo para ser uma emocionante narrativa da saga dos 33 mineiros que ficaram soterrados numa mina de ouro, no deserto do Atacama, em 2010. Por exemplo, o resgate assombroso, por meio de uma cápsula que desceu ao coração da mina e então subiu à superfície 33 vezes, até que todos os trabalhadores fossem trazidos de volta com vida, é retratado no filme sem destaque dramático, como se fosse um desfecho natural de uma proeza impressionante. Antonio Banderas está muito bem como Mario Sepúlveda, líder natural do grupo, e Rodrigo Santoro faz um belo trabalho como o ministro das Minas chileno, sem cujo esforço, não teria havido busca nem, muito menos, salvamento. No geral, faltou uma visão mais ampla da história, muito por causa do tom desnecessário de exaltação, que resultou em cenas canhestras, como a “última ceia” no interior da mina e uma certa superficialidade dos personagens – ou seja, numa história como esta, é até irônico que a diretora não tenha ido mais fundo.

segunda-feira, 10 de outubro de 2016

2830 - SPOTLIGHT - SEGREDOS REVELADOS


SPOTLIGHT – SEGREDOS REVELADOS (USA, 2015) – O ganhador do Oscar de Melhor Filme de 2016 é realmente excelente, explorando (no bom sentido) todos os passos que a equipe do Boston Globe teve de trilhar para denunciar os inúmeros casos de pedofilia perpetrados por padres de uma das cidades mais católicas dos Estados Unidos. Estes padres eram sistematicamente acobertados pela Igreja que, além disso, não os afastava dos fiéis, mas os remanejava de paróquia em paróquia, conforme os casos iam acontecendo. O diretor Tom McCarthy mostra, detalhadamente, os rituais da redação e os valores imperativos que representam o que se pode chamar de “grande jornalismo”, uma instância que requer um grau altíssimo de independência e disposição para romper paradigmas. O elenco é superlativo: Mark Ruffalo, Michael Keaton, John Slattery, a belíssima Rachel McAdams e o grandíssimo Stanley Tucci. O filme que McCarthy fez da persistente apuração levada a cabo pelo "Globe" é sóbrio, cinzento como uma tarde bostoniana. Em meio às inevitáveis cenas de jornalismo explícito (anotações frenéticas, portas batidas na cara de repórteres etc.), uma aura de suave heroísmo banha a equipe do jornal. Não há uma ditadura sanguinária a que se combater, mas a melíflua e sufocante influência que a igreja irradia sobre Boston e que se faz sentir dentro mesmo de seu principal periódico, onde muitos editores provêm de tradicionais famílias católicas. Foi devido à obsessão de três forasteiros –um editor-executivo judeu, um repórter de origem portuguesa e um advogado armênio– que se rompeu o circuito da inércia acomodatícia, quando o jornal, depois de tatear às cegas, decide enfim aprofundar a investigação dos indícios de abuso. A mensagem globalizante também pode ser uma representação dos efeitos de um mundo cada vez mais conectado que começava a aparecer no longínquo ano de 2001, época em que ocorreram os fatos do filme.

terça-feira, 4 de outubro de 2016

2829 - PRENDA-ME SE FOR CAPAZ

PRENDA-ME SE FOR CAPAZ (CATCH IF YOU CAN, USA, 2002) – Este delicioso filme de Spielberg, logo nos créditos iniciais, com uma charmosa interface retrô, vai dando o clima da história de Frank Abagnale Jr., um dos maiores fraudadores de todos os tempos. Entre 1963 e 1967, ele descontou cerca de 2,5 milhões de dólares em cheques fraudados (com técnicas de própria invenção), em 26 países e em todos os Estados americanos, fez-se passar por piloto da Pan Am, chefe da emergência pediátrica de um hospital, procurador do Estado, sempre driblando, com agilidade impressionante, os policiais que o perseguiam. A história de Abagnale Jr é, antes de tudo, uma ode nostálgica a um tempo em que a abordagem de um desconhecido não fazia soar alarmes de desconfiança. Leonardo DiCaprio, como protagonista, já demonstrava o imenso talento para viver um personagem riquíssimo (em todos os sentidos) com aquele charme juvenil no qual é especialista. Dirigido com gosto por Spielberg, ele está à vontade nas situações mais incríveis, sempre tendo na sua cola os agentes liderados por Tom Hanks (perfeito, na sua atuação contida, dando todo o espaço possível para DiCaprio). O desfecho desta quase fábula é tão sensacional quanto inesperado e comprova que, ao contrário de alguns cheques frios, o crime pode, eventualmente, compensar.  

domingo, 2 de outubro de 2016

2828 - TRÊS SOLTEIRÕES E UM BEBÊ

TRÊS SOLTEIRÕES E UM BEBÊ (THREE MEN AND A BABY, USA 1987) Esqueçam todas as comédias sobre solteirões mulherengos, produções descerebradas e sem graça como, por exemplo, SE BEBER, NÃO CASE, e celebre este delicioso filme estrelado por Tom Selleck, Steve Guttenberg e Ted Danson, dirigido por ninguém menos que Leonard Nimoy. Ainda hoje, TRÊS SOLTEIRÕES... mantém a leveza que o transformou num clássico. Do trio protagonista, Tom Selleck está perfeito, num personagem de imediata empatia, Steve Guttenberg vem bem como coadjuvante, mas o grandíssimo Ted Danson mereceria ter mais espaço para seu talento histriônico, especialmente porque estava no seu auge com CHEERS. O subplot do tráfico das drogas poderia ter ficado de fora do roteiro final, pois em nada acrescenta à história. De resto, as agruras de três homens às voltas com um bebê deixado na porta de seu apartamento (e que apartamento: chega a ser mais um personagem) são mostradas com graça e ritmo perfeitos. Na lista entre os melhores dos anos 80.   

quinta-feira, 22 de setembro de 2016

2827 - JACQUELINE BOUVIER KENNEDY ONASSIS 1993 INTIMATE PORTRAIT

JACQUELINE BOUVIER KENNEDY ONASSIS 1993 INTIMATE PORTRAIT (USA, 1993)Documentário sobre a vida de Jackie, antes e depois do casamento com JFK, detalhando suas habilidades de moça da alta sociedade americana, seu estilo de vida refinado e sua dedicação ao marido senador e, depois, presidente. A segunda parte, enfoca sua vida com Onassis e sua volta a Nova Iorque, depois que o magnata morre, no início dos anos 70. Vem aí um filme com Natalie Portman no papel de Jackie - vamos ver como esta figura tão pouco explorado poderá render numa cinebio.

terça-feira, 13 de setembro de 2016

2826 - SEM VESTÍGIOS

SEM VESTÍGIOS (UNTRACEABLE, USA 2008) – Diane Lane é uma das atrizes mais carismáticas do cinema americano, desde os sucessos O SELVAGEM DA MOTOCICLETA e RUAS DE FOGO. Neste suspense, ela é Jennifer Marsh, uma agente do FBI que investiga uma série de crimes exibidos em tempo real por um site. O roteiro é previsível – adivinhe quem será a próxima vítima? De qualquer forma, a atuação correta de Diane mantém o interesse até o desfecho meio delirante. “Sem Vestígios” poderia fazer alguns ajustes na construção da narrativa, como ignorar a vida familiar de Jennifer e uma perda do passado, que ocupam um bom espaço da metragem mas que pouco pesam quando os perturbadores acontecimentos finais se apresentam. Mas é oportuno o proveito que fazem do fato de utilizar a Internet como entretenimento por meio de acessos a conteúdos extravagantes, como filmagens de indivíduos no ato da própria morte, ou cenas de intimidade explícita. Ainda assim, o filme funciona por Diane Lane, perfeita na composição do personagem, mesmo num roteiro que seria bem melhor com revisões mais acuradas.

segunda-feira, 12 de setembro de 2016

2825 - UM DIA DE FÚRIA


 



 
UM DIA DE FÚRIA (FALLING DOWN, USA 1993) - Após perder seu emprego, William Foster (Michael Douglas, perfeito na sua obstinação neurótica) decide ir ao encontro de sua ex-mulher Beth (Barbara Hershey) e sua filha (que faz aniversário), apesar de estar impedido legalmente de fazer isto. No caminho, ele é obrigado a enfrentar o trânsito congestionado da cidade de Los Angeles, debaixo de um sol escaldante e em meio à grande poluição. Irritado, William decide largar o carro e seguir a pé. Mas, ao parar para tentar fazer uma ligação, ele acaba discutindo com um comerciante e explodindo, dando início a uma série de situações que complicam cada vez mais o seu dia. Quando a situação sai totalmente de controle, o veterano policial Prendergast (Robert Duvall, brilhante), prestes a se aposentar, decide tentar impedir que uma tragédia ainda maior aconteça. Este é um dos filmes icônicos da década de 90. Seu temperamento agressivo é apresentado ao espectador logo na primeira cena do filme, quando um close em detalhes de seu rosto suado e angustiado dá início a sequência que levará aquele homem a largar tudo para trás. Aliás, a direção de Joel Schumacher é competente na transmissão deste sentimento crescente de angústia, através do silencio que lentamente se transforma num barulho irritante, do travelling que passa pelas outras pessoas presentes nos carros parados no congestionamento, e do calor infernal daquele dia, refletido nas cores quentes da fotografia de Andrzej Bartkowiak. Quando William larga o carro parado na rua e sai andando, dizendo “Vou pra casa!”, sabemos que ele chegou ao limite.


 
 

2824 - GOOD KILL: MÁXIMA PRECISÃO

GOOD KILL: MÁXIMA PRECISÃO (GOOD KILL, USA, 2014) – Interessante investida do cinema no universo psicológico dos pilotos dos drones que, de longe, numa posição de total segurança, bombardeiam os cenários de guerra, causando, vez por outra, danos colaterais, com a morte de inocentes. O Major Thomas Egan (Ethan Hawke, muito bem no papel) é um desses pilotos que começam a ter crises de consciência e de ética por causa de sua atividade. O conceito de "guerra limpa" traz consigo uma ambiguidade moral difícil de discernir, algo que se adensa se pensarmos nas potenciais e reais motivações desta "Guerra ao Terror". A bela January Jones, de MAD MEN, faz a esposa de Egan.

quinta-feira, 8 de setembro de 2016

2823 - PEQUENO DICIONÁRIO AMOROSO 2

PEQUENO DICIONÁRIO AMOROSO 2 (BRASIL, 2015) – Com esta sequência, perdeu-se o encanto da história original, com uma revitalização meio forçada no roteiro que, agora, inclui um núcleo mais jovem, além de uma discussão bizantina sobre a bissexualidade feminina. Os dois protagonistas talentosos estão de volta – Daniel Dantas e Andréa Beltrão - ela com a expressão meio engessada com um aparente preenchimento facial que acabou por esvaziar sua atuação. Ficaram muitas pontas soltas na história, que acaba em aberto, dando uma sensação de frustração a quem esperava mais de uma premissa que funcionou em 1997, mas que agora não passa de uma flébil tentativa de refletir a dinâmica das relações fluidas da pós-modernidade.  

quarta-feira, 7 de setembro de 2016

2822 - PONTE DOS ESPIÕES

PONTE DOS ESPIÕES (BRIDGE OF SPIES, USA 2015) É um Spielberg clássico: o protagonista que se caracteriza por um impulso de integridade muito mais forte do que o apego à família ou à própria vida, cuja honestidade na consecução de seus objetivos está acima de tudo, fazendo, com isso, que ele se destaque no cotejo com os outros agentes da história, quase todos comuns e sem entender muito bem por que alguém se apega a ideais tão nobres. Assim é o James Donovan de Tom Hanks, um desses atores talhados para personagens dessa craveira. Na complicada, sutil e, claro, perigosa missão de administrar a troca de dois espiões, em plena Guerra Fria, Donovan ainda encasqueta que tinha que libertar também um estudante americano que nunca espionara coisa alguma, além do talvegue do decote da namorada alemã. Tudo, em PONTE DOS ESPIÕES, orbita em torno das ínfimas variações de luz de cada cena, da interpretação cuidadosa do que é dito (e não dito), do equilíbrio entre as ações, suas consequências e implicações. É uma aula de etiqueta e decência humana que deveria ser ensinada nas escolas. Atenção para a cena em que Hanks e o premiado (justamente) com o Oscar Mark Rylance experimentam um encontro de almas: “Você não parece estar preocupado”, diz Donovan, intrigado, ao homem que acabou de ser informado de que a pena de morte será o desfecho provável. “E se eu estivesse, ajudaria? ”, retruca o Abel vivido com primor por Rylance. Aí está um fundamento que deveria ser incorporado por todos: a serenidade, porque nada justifica o desespero.  

terça-feira, 6 de setembro de 2016

2821 - PERDIDO EM MARTE

PERDIDO EM MARTE (THE MARTIAN, USA 2015) – Versão espacial de NAÚFRAGO, com Tom Hanks, PEM ainda tem o mérito de somar ao drama de um astronauta esquecido no Planeta Vermelho um delicioso senso de humor, com tintas do universo pop – em uma das cenas, ao som de Starman, de David Bowie, veem-se centenas de cientistas da Nasa e da agência espacial chinesa, milhões de pessoas em todo o mundo e um solitário homem preparando-se para o que seria o maior resgate de um náufrago já efetuado na história. Afinal, são 225 milhões de quilômetros de separação (nada, se comparado ao que já passamos, don't you think , J...?). Um personagem assim, em um ambiente tão inóspito, com uma carga dramático-sentimental tão grande quanto a distância que o separa de casa, só poderia ser vivido por atores como Hanks, no filme de Robert Zemeckis, e Matt Damon, nesta fabulosa obra de Ridley Scott, cujo estilo mão pesada de dirigir está saudavelmente ausente aqui. Além de Damon – um ator que logo se transforma no seu amigo de infância a partir do primeiro fotograma – o elenco de PEM (a piada é intencional) é estelar: os grandíssimos Chiwetel Ejiofor, como o cientista do bem que não desiste do resgate, e Jeff Daniels, em pleno modo Newsroom, cheio de saídas secas e olhares de fastio, e a belíssima Jessica Chastain, cuja ruividão combina muito bem com as cores afogueadas de Marte. O filme é equilibrado na sua ousadia trocista e, da mesma forma, é habilidoso no uso dos elementos de que dispõe. Damon apresenta seu personagem – Mark Watney - com uma verdade visceral e honesta, a ponto de dar uma conotação factual e coerente a uma solidão cósmica que muitos de nós já experimentamos aqui mesmo na Terra. É uma ode ao otimismo que, ao mesmo tempo, nos lembra de que somos, definitivamente, anacoretas sempiternos, cercados de outros na mesma condição, em qualquer lugar no universo.

domingo, 4 de setembro de 2016

2820 - BOND GIRLS PARA SEMPRE

BOND GIRLS PARA SEMPRE (BOND GIRLS ARE FOREVER, USA 2002) – Documentário composto de clips das atrizes que tiveram o papel de bond girl, e entrevistas feitas por uma delas, Maryam d”Abo, titular em 007 THE LIVING DAYLIGHTS, com Timothy Dalton. O aspecto mais interessante é a evolução feminista da personagem, que passou de coadjuvante do tipo “mulher-objeto” para uma participação mais ativa, a partir dos anos 90. A produção é bem feita e oferece uma boa perspectiva do universo bondiano. Eva Green - veja aí do lado - se destaca como uma das mais mesmerizantes, não é Joe?
    

quarta-feira, 31 de agosto de 2016

2819 - TERREMOTO - A FALHA DE SAN ANDREAS

TERREMOTO: A FALHA DE SAN ANDREAS (SAN ANDREAS, USA 2015) – Esta é a melhor definição para este filme: é realmente um desastre. Tirante alguns – poucos - momentos razoáveis de CGs, tudo é muito ruim, do elenco ao roteiro. A única honrosa exceção é a presença de Paul Giamatti, perdido dentro de um personagem que em nada acrescenta à história: ele é o cientista que, supostamente, achou um meio de prever a ocorrência dos terremotos, façanha que teria poupado a vida de milhões de pessoas, caso, claro, os roteiristas a tivessem incluído na história. Mas não foi isso que aconteceu. O terremoto veio com vontade, destruindo LA e São Francisco inexoravelmente. Porém, curiosamente, não se percebe um pânico autêntico nas pessoas que correm pelas ruas – o cinema digital, frio e sem emoção, domina o espetáculo, e raras cenas são, de fato, convincentes. Se o tsunami engolindo a Golden Gate chega a impressionar, quase nada se vê da população em desespero. Parece que Roland Emmerich, o maior especialista em filme-catástrofe, fez falta nesta lamentável produção cheia de falhas - a blague é intencional. O roteiro segue o protocolo para apresentar personagens esquemáticos, sem qualquer apelo dramático ou capazes de provocar empatia com o espectador. Bem, basta dizer que o protagonista é Dwayne Johnson, que, em priscas eras, era chamado de The Rock – o que é uma injustiça: uma pedra cuspida de qualquer poço de lava incandescente teria mais expressão. A falta de originalidade reaparece no imbróglio familiar – ele ainda gosta da ex-esposa, se sente culpado pela morte da filha mais nova e cobre de cuidados a mais velha, a adolescente Blake (Alexandra Daddario, com todas as condições, Michael). Se você dispõe de duas horas preciosas de sua vida para jogar fora, esta é a oportunidade. SAN ANDREAS ganha fácil o prêmio de pior do ano, se não década. Este é o tipo do filme cujos produtores deveriam dizer, com propriedade, sem qualquer estremecimento: “Desculpem a nossa falha...”.


terça-feira, 30 de agosto de 2016

2818 - O DOSSIÊ PELICANO

O DOSSIÊ PELICANO (THE PELICAN BRIEF, USA 1993) – Estava em Richmond, quando este filme foi lançado, e ainda me lembro do impacto ao assisti-lo no grande cinema da Broad Street, juntamente com um grupo da faculdade. Denzel Washington, sempre obrigatório, e Julia Roberts, nem sempre, conseguem galvanizar nossa atenção neste thriller de suspense bem ao estilo hitchcockiano, dirigido por Alan J. Pakula. Julia é Darby Shaw, uma estudante de Direito que descobre uma conspiração para assassinar dois juízes da Suprema Corte, com a anuência da Casa Branca. Washington é Gray Grantham, o repórter que a ajuda na investigação. O roteiro é bem urdido e as reviravoltas açulam o interesse até o desfecho, meio ao estilo de Casablanca, com Darby e Gray se despedindo num aeroporto, numa sequência com um pé no kitsch que destoa do filme como um todo. Não adianta sinoptizar além do que já foi analisado, sob o risco de expor alguns spoilers, mas é interessante notar a estranheza ao rever como, na época, eram feitas as investigações jornalísticas e policiais sem a ajuda da internet. Sob a ótica pós-moderna das possibilidades virtuais, uma história desta natureza, sem celulares e buscas no Google, parece quase inimaginável.   
 

segunda-feira, 29 de agosto de 2016

2817 - LUTA PELA ESPERANÇA

A LUTA PELA ESPERANÇA (CINDERELLA MAN, USA 2005) – Dois dos mais carismáticos e talentosos atores do cinema contemporâneo – Russel Crowe e Paul Giamatti –, um roteiro amarradinho, um personagem que epitoma uma história de heroica de superação, um diretor especializado em personagens históricos e pronto: o filme de Ron Howard prende a nossa atenção do começo ao fim, sem cair na armadilha do lugar-comum e dos clichês que os filmes sobre boxe sempre apresentam. Raros atores possuem a força cênica de Russel, que passa uma coisa que está muito além do que se pode chamar de competência dramática. É o olhar, a postura, um virar de rosto entre silêncios. Aqui, ele é o boxeador James Braddock que, durante a Grande Depressão americana, perdeu o status e dinheiro, conseguindo incertos trabalhos nas docas, até desafiar o campeão mundial e, por fim, voltar a experimentar o sucesso. Russel vai passando por estas etapas mostrando uma integridade fora do comum, construindo o personagem que tinha tudo para ser igual aos outros do gênero, mas que nele fica saudavelmente original e autêntico.    

sexta-feira, 26 de agosto de 2016

2816 - DIA DE TREINAMENTO

DIA DE TREINAMENTO (TRAINING DAY, USA 2001) – Já sabem: Denzel Washington é obrigatório, pois já chegou ao empíreo dos maiores do cinema. Dito isso, vale a pena rever este excepcional filme de Antoine Fuqua, no qual Washington é o detetive Alonzo Harris, um policial corrupto de Los Angeles que passa um dia com um novato (Ethan Hawke), para lhe mostrar como é a ação de campo do departamento de narcóticos. “Cool” e descolado, a princípio (vejam a sensacional cena em que os dois se encontram pela primeira vez, numa lanchonete), Harris vai se revelando cada vez mais violento e partícipe dos procedimentos que deveria combater, equilibrando-se, genialmente, entre o sarcasmo e a ambiguidade de um personagem que se apresenta com uma cópia de valores contraditórios. Denzel Washington ganhou o Oscar de Melhor Ator por este papel.