terça-feira, 5 de abril de 2016
2757 - O MÉDICO ALEMÃO
O MÉDICO ALEMÃO (WALKODA, Argentina, 2013) - O
filme de Lúcia Puenzo narra algumas semanas da convivência do médico nazista
Josef Mengele com uma família de classe média argentina e sua tentativa de
ajudar a resolver o problema de crescimento da filha do casal. A jovem Lilith, cuja
estética aproxima-se do modelo ariano de beleza, é considerada baixa para os
seus doze anos. Contra a vontade do pai, mas com a conivência da mãe (de origem
alemã), o médico, que condenou à morte um número incalculável de crianças
consideradas baixas, tenta mudar o processo natural de crescimento da menina,
procurando transformá-la em um ser esteticamente perfeito. Mengele quer transformá-la
em sua mais nova cobaia. Sua intenção é repetir o mesmo tipo de experiência que
testara em milhares de judeus do campo de concentração de Auschwitz. Eugenista,
o que é quase um sinônimo de nazista, o médico acreditava que a mistura das
raças era prejudicial ao desenvolvimento da humanidade e que era possível
alterar o patrimônio genético das pessoas no sentido de transformar alguns
seres humanos em um protótipo da raça perfeita de super-homens (reinterpretação
vulgar e tendenciosa do conceito nietzschiano de “Übermensch”) sonhada por
Hitler. O roteiro insere um elemento meio óbvio para fazer a ponte entre o delírio
do médico e a atividade profissional do pai da menina: ele é um fabricante
artesanal de bonecas. Esta metáfora pretende mostrar o que seria a Alemanha, se
o nazismo tivesse triunfado: uma sociedade despersonalizada transformada em um
grupo de bonecas (de autômatos?), louras de olhos azuis, produzidas, em escala
industrial, pelas mãos de um simples artesão. As belas paisagens da Patagônia procuram
amenizar o terror contido no semblante fleumático de Mengele, vivido com
maestria pelo ator espanhol Alex Brendemühl, que também estaria perfeito numa
cinebio de Omar Shariff. A históra também nos remete a Lolita, em função da
relação de sedução mútua entre ele e a menina Florencia Bado. E é justamente
nessa imperturbabilidade e ausência de paixões do médico que reside todo o
suspense do filme. Sua atitude conduz o espectador a se inquietar sobre o
destino da menina e os membros da família a se questionarem sobre a natureza da
ajuda, sobre se eles estariam sendo testemunha do humanismo de um médico
generoso e solidário ou vítima e presa das maldades de um monstro.