sábado, 31 de outubro de 2015

2704 - MAIS ESTRANHO QUE A FICÇÃO

MAIS ESTRANHO QUE A FICÇÃO (STRANGER THAN FICTION, USA 2006) – Will Ferrell é Harold Crick, um homem metódico, de hábitos tão rígidos que, quando começa a ouvir dentro de sua cabeça uma voz de mulher, inglesa, que narra cada um dos seus gestos com mais estilo, e melhor escolha de palavras, do que ele próprio estaria apto a empregar, percebe que algo excepcional está prestes a acontecer. Com a ajuda de um professor de literatura (Dustin Hoffman), Harold descobre que passou a ser o personagem de um romance que está sendo escrito por Kay Eiffel (Emma Thompson). Quando descobre que Kay vai matar seu personagem central, que é ele próprio, Harold tenta convencê-la a mudar o desfecho. O mais interessante nesta história que tem laços fortes com o universo fantástico é mostrar que mesmo as pessoas das quais se costuma desdenhar podem conter gestos insuspeitáveis de grandeza. O diretor Marc Foster vira do avesso o batido mote do ‘loser que desabrocha’. O cinema indie de Hollywood tem forte tendência à fracassomania - quanto mais desgraçado o personagem principal, mais bonita será a sua volta por cima. Forster subverte a situação com ironia: até o próprio Crick sabe que é um perdedor, porque há uma voz, contando sua história, que não para de repetir isso. A autoconsciência hamletiana é a grande chave do filme. Somente ao entender a sua própria situação Crick tem a chance de domá-la. Nesse ponto, não há metalinguagem maior: onisciente, o personagem deixa de ser marionete do contador de história. Isto é, destronar o narrador da confortável posição de tirano, de dono total de sua biografia, é a grande sacada do autor deste roteiro. Maggie Gyllenhall está impressionantemente graciosa como objeto de paixão de Harold.