a conquista da honra (flag of our fathers, usa 2006) – outra extraordinária aula de cinema de Clint Eastwood. Aqui, ele mostra o outro lado da tomada da ilha de Iwo Jima pelos americanos, indo além do massacre no campo de batalha: desvenda, sem cerimônia, a articulação do marketing de guerra que visava à captação de recursos através da venda de bônus. Para tanto, três dos soldados que levantaram a bandeira americana no alto do Monte Suribachi, simbolizando a união de todos os americanos, foram “convocados” para uma turnê pelo país. Juntos, arrecadam 28 milhões de dólares para os cofres da Defesa. Todos os três foram aos poucos desmoronando, vitimados pelo stress pós-traumático, pela culpa de ter sobrevivido e pela vergonha de usar o epíteto de heróis enquanto quase 7000 de seus companheiros iam morrendo em solo japonês. Eastwood levanta questões importantes: a leviandade com que se emprega a palavra heroísmo e as cicatrizes que a guerra deixa naqueles que conseguem sobreviver. O filme é extraordinário, mais pela coragem de expor o aspecto sórdido do jingoísmo e do absurdo da guerra em si do que pela dramaticidade das cenas do conflito. A Conquista da Honra é muito complexo e incômodo do que Cartas de Iwo Jima, sobretudo para uma indústria de mitos como Hollywood. A história, magistralmente dirigida por Clint, é uma ótima oportunidade para discutir os valores que formaram uma sociedade com tanta necessidade de fabricar, consumir e descartar heróis. O melhor filme de guerra dos últimos anos, na realidade, não é sobre a guerra em si, mas sobre uma foto – o grande Clint Eastwood, numa obra metafísica, dialoga com a “câmara clara” de Barthes, ao mostrar como uma simples captação de uma imagem, em uma fração de segundo, dilata o tempo, reordena as ações e oferece novos sentidos à vida. Os dois filmes são complementares e refletem sobre até que ponto de barbárie pode chegar o homem dividido em nações. O título em português é bom, mas perde a sonoridade aliterada do original.