segunda-feira, 8 de outubro de 2007

142 - TROPA DE ELITE


tropa de elite (brasil, 2007) – de José Padilha. Sucesso mais que justificado, Tropa de Elite é mais um típico filme brasileiro. Brasileiro porque, embora tenha lá suas inspirações na SWAT americana, toca na ferida do caos urbano que é a guerrilha carioca do tráfico de drogas. Toca apenas não – fura, maltrata, aperta, arrebenta e mais qualquer outro verbo perfurocortante que exista. A violência urbana é isso que se vê na edição nervosa, mas eficiente, do filme sobre, entre outras coisas, as atividades do BOPE, que reúne os mais malvados heróis do cinema nacional jamais vistos. Tudo sob a ótica, ao mesmo tempo fria e emocionada, do capitão Nascimento - um vulcânico desempenho de Wagner Moura - que se esforça para deixar o batalhão em função da chegada do primeiro filho. Ele precisa decidir quem o substituirá nas incursões mais perigosas às favelas: Neto (Caio Junqueira) ou Matias (André Ramiro, numa ótima estréia como ator). O primeiro é perigosamente impetuoso, e o segundo é inteligente, mas se encontra dividido entre a carreira na polícia e o curso de Direito, onde convive com a classe média consumidora de drogas. Paralelamente a isso, um grupo de jovens trabalha numa ONG na favela no intuito de ajudar as pessoas. A tropa de elite aposta na violência esquece e subverte o lema “tortura nunca mais”, o que, assustadoramente, ganha a platéia, acostumada a reclamar exatamente disso. Vale como cinema polêmico? Vale. Vale como denúncia de que os ricos financiam a indústria da droga? Vale. Vale como exposição da podridão das instituições exemplares como a polícia militar? Vale também. Vale como pedra incômoda no sapato dos otimistas? Vale sim, a ponto de a gente se perguntar como isso tudo se mantém às custas de vidas humanas e não só de inocentes. Agora, vale como motivo de reflexão daqueles que realmente podem mudar esse cenário? Não sei. A ver. Essas questões aparecem quando obras de ficção retratam a realidade, despertando o debate sobre o nexo causal entre a violência e as estruturas subjacentes a ela. O personagem de Moura, o capitão Nascimento, por exemplo, poderia ser enfocado por uma ótica hamletiana: sua angústia reflete, de certo modo, o comportamento dividido do príncipe dinamarquês que dialoga com a caveira (símbolo do BOPE) e se vê diante de atitudes de vingança e de questionamentos de valores. O que permeia o filme, então, mais do que a violência implícita, é o desejo visceral de não ser corrupto. Uma outra linha de pensamento se impõe em função do imenso sucesso popular de Tropa de Elite: é curioso constatar a contradição de o público ter se interessado tanto por esta produção através de um meio ilícito – a cópia ilegal. Ou seja, as pessoas viram um filme que fala do crime, usando um produto do próprio crime organizado - a pirataria. Isso é mais um exemplo de que a sociedade brasileira vive de uma profusão de ilegalismos, também mostrada na história. No fundo, Tropa de Elite é uma discussão sobre a grande tragédia humana, a do descompasso entre a intenção e a realização. Tanto o capitão Nascimento quanto o grupo de jovens ongueiros querem acabar com a iniqüidade e melhorar as condições de vida das pessoas. A verdadeira tragédia está aí: eles não conseguem mudar o mundo e acabam engolidos pelo “monstro” representado pelo sistema que tanto combatem.