terça-feira, 28 de dezembro de 2010

983 - 500 DIAS COM ELA


500 DIAS COM ELA (500 DAYS OF SUMMER, USA 2009) – de Marc Webb. O filme “500 dias com ela” (500 days of Summer) é uma brincadeira séria sobre um assunto que muito nos interessa, porque muito nos acontece: o desencontro amoroso. Shakespeare já falava disso e, num tempo bem mais recente, há uma obra prima dos Beatles, “Hello, Goodbye”, que traduz com extrema simplicidade as divergências amorosas: “you say goodbye, and I say hello”. Sim, pois é um drama de dimensões ingentes não encontrar com a pessoa amada e, pior até, desencontrar-se dela, quando mais a procura. “Por que você diz adeus exatamente agora quando digo alô?”. Basta abrir a janela e lá fora estarão casais que foram e, de repente, deixam de ser, gente sozinha que se perdeu na própria busca, jovens, os nem tão jovens assim, baixos, altos, gordos, magros, ricos, pobres. Todos se lembrando de uma história que passou ou sentindo aquela saudade do futuro, de tudo aquilo que ainda virá e que se advinha nos olhos daquela que passa distraída, ou no semblante daquele que parece estar atrasado para o trabalho. No filme, Tom se apaixona por Summer, eles se aproximam, mas um fato torna a existência do rapaz um tormento permanente: ela não acredita no amor e no compromisso da entrega, coisas que são essenciais à alma romântica de Tom, que sofre, sofre, sofre, pois está certo de que é ela a pessoa que dará sentido à sua vida, a quem amará total e incondicionalmente e que, claro, espera receber igual devoção do objeto amado. Summer, por sua vez, é uma torre de certezas sobre a forma como quer amar e ser amada. Nos 500 dias que passam juntos, Tom e Summer vivenciam inúmeros encontros e desencontros e chegam até a pensar que o amor é isso mesmo – um constante processo de inconstâncias, de diferenças que se harmonizam, dia sim, dia não. O que chama a atenção é a diferença entre os dois reside principalmente naquilo que deveria os unir: a dimensão do sentimento, que nele se manifesta como uma hidrelétrica que se rompe e, nela, aparece tímida, como uma torneira que pinga. Acontece que, neste ponto, não dá para cotejar o amor dos dois. Eles amam, isto é certo. Outra história é como eles se amam. Durante o filme, é fácil bipolarizar a questão e considerar, em alguns momentos, Tom como a vítima e Summer como a vilã. Mas não é nada disso, nem no filme nem na vida, vamos aprender logo depois, como os acontecimentos que se precipitam sobre os dois. Vamos, assim, concluindo que não há perdedores nos jogos amorosos, embora seja uma tentação querer impor aos jogadores papéis de injustiçado, perseguido, humilhado, etc. Claro que, mesmo com a dimensão lúdica que a palavra “jogo” sugere, nas experiências amoráveis, corre-se o risco de ressentimentos e mágoas, que são logo esquecidos com a chegada de um novo e grande amor, como já dizia Vinicius. Por isso, é interessante vermos como Tom descreve o pouco mais de um ano que passou com Summer, como avalia as situações sob o seu particular ponto de vista sentimental, como sente que ela é o seu destino neste vale de lágrimas. Os dias de outono podem ser tão proveitosos que os dias de verão, como diz o título em inglês, fazendo um jogo de palavras, impossível em língua portuguesa, que tem tudo a ver com o desfecho da história. Este é um daqueles filmes que podem ser apenas um passatempo para a sessão da tarde, como também um bom pretexto para reflexões mais profundas a respeito dos relacionamentos amoráveis que mantemos ou que queremos manter. De qualquer forma, é muito bom poder se equivocar de vez em quando, até acertar, pois se acumula com isso experiência e paciência, duas palavrinhas valiosas que rimam além dos sufixos que gramaticalmente as unem e que se mostram mais que úteis no mapeamento amoroso. A paciência nos faz ter mais critério na hora de escolher e nos salva de armadilhas fatais. Por outro lado, a experiência, cumulativa e globalizante, nos dá o GPS interno que nos guia aonde queremos chegar e a segurança para dar o primeiro passo, dizer a melhor palavra e mesmo interromper qualquer coisa supostamente importante para que o amor de outono possa entrar definitivamente, ou não, na nossa vida.