CADÊ OS MORGANS?(DID YOU HEAR ABOUT
THE MORGANS?, USA, 2009) – Hugh Grant é um dos meus atores favoritos. Invariavelmente,
faz, a cada filme, uma versão pouco alterada de si mesmo – o inglês deslocado,
tímido, sempre tentando fazer a coisa certa e, claro, se dando mal – e isso é ótimo!
Neste filme, ele e a esposa (Sarah Jessica Parker, inadequada para o papel)
testemunham um assassinato e são mandados pela polícia para o interior, numa espécie
de serviço de proteção à testemunha. A história é previsível, mas divertida, e conta
ainda com o maravilhoso Sam Elliot e Mary Steenburgen. Hugh Grant is one of my favorite actors. Invariably,
he repeats an unaltered version of himself in every movie – the out-of-place shy
British man, always trying to do the right thing and, of course, in the end, blowing
everything – and this is great! In this movie, he and his wife (Sarah Jessica
Parker, unfitted for the role) witness a murder and are sent by the police to
the countryside, in a witness protection program. The story is predictable but
fun and it is counts with the wonderful Sam Elliot and Mary Steenburgen.
CORINGA
(JOKER, USA, 2019) – Lôbrego, visceral, chocante e magistralmente ancorado
na atuação memorável de Joaquin Phoenix, que sangra, transpira, se desespera e
chora em cada segundo de sua magnífica personificação do mais angustiante
Coringa já visto. E também ri: um ricto involuntário de insanidade e desesperança
que, devo dizer, me acompanha até agora, duas semanas depois de ver o filme. A direção
e o roteiro são perfeitos, e o tom sombrio da história torna-se quase palpável do
início ao fim. Até porque, em grande medida, estamos todos vivendo uma realidade
massacrante que nos transforma em subindivíduos, numa sociedade incapaz de
manter níveis aceitáveis de bem-estar social para as classes sociais mais pobres,
além de não permitir a estes indivíduos oportunidades de desenvolvimento social,
profissional e humano. O ponto fulcral: o filme é totalmente de Joaquin
Phoenix, capaz, especialmente nas várias cenas em que permanece em longo e angustiante
silêncio, de compor com impressionante verdade um homem destroçado, física e
emocionalmente, subtraído de sua alma e esperança e que, na tristeza, loucura e
compaixão, vai se tornando monstruoso, como a sociedade em que está inserto. O diretor
Todd Phillips presta uma homenagem a Martin Scorsese e a Robert De Niro, emulando
a Nova Iorque decadente da década de 70, tão bem representada em TAXI DRIVER. Ao
fim, não há como esquecer, entre sangue, desespero, horror e constrangedora
constatação, que CORINGA é um retrato muito próximo do desmoronamento sócio, político
e existencial do sentido da vida na pós-modernidade. Tragic, visceral, astonishing and masterly anchored
in the memorable performance of Joaquin Phoenix, who bleeds, sweats in
desperation and cries in every and each second of his magnificent
personification of the most anguished Joker ever. And also laughs: an
involuntary and despaired laugher that, I should say, has been burnt in my
memory for two weeks, after seeing the movie for the first time. The directing and writing is slickly
brilliant and the bleak settings and tones are palpable throughout. That’s because, in a certain way, we are all living in
a crushing reality that makes us less than individuals, in a society incapable
of keeping the welfare for the lower classes and preventing its members from social,
professional and existential development. The pivotal aspect of the movie is Joaquin
Phoenix’s performance and his ability to keep silent for long and distressing moments
to compose the impressive truth of a physically and emotionally devastated man deprived
of his soul and hope, who in sadness, insanity and compassion becomes a monster,
like the society around him. Director Todd Phillips pays homage to Martin Scorsese
and to Robert De Niro, emulating a decaying New York of the 70s, as we can see
in TAXI DRIVER. All in all, it cannot be forgotten, among blood, despair,
horror, and compelling conclusion, that JOKER is a very close portrait of the
social, political and existential sense of life in post-modernity.
FRATURA
(FRACTURED, USA, 2019) – Eficiente thriller de suspense psicológico
estrelado por Sam Worthington, embora com alguns twists previsíveis. Bom trabalho
de câmera do diretor Brad Anderson, assim como a cinematografia. O ritmo é mantido
regularmente até o desfecho, e o roteiro alterna pistas falsas com verdadeiras,
mantendo a curiosidade até a última cena: um casal leva a filha de seis anos,
com o braço quebrado, para um hospital onde, após a chegada, as duas desaparecem
misteriosamente. Sam Worthington
tem atuação muito satisfatória. An efficient psychological thriller, starred by
Sam Worthington, despite some predictable twists. Director Brad Anderson was
excellent with his camera work, as was the cinematography. The pace is kept until the end, and the plot is OK
throwing some obvious and not so obvious curve balls, maintaining the perfect edge-of-your-seat
tension and suspense to the last scene: a couple takes their six-year-old daughter
with a broken arm to a hospital where, after their arrival, the mother and the
kid mysteriously disappear. Sam Worthington has a satisfactory performance. Netflix.
FLEABAG
(UK, 2016) – A série, em duas temporadas curtíssimas, da inimitável,
extraordinária e inesperadamente sexy Phoebe
Waller-Bridge se constitui, definitivamente, os melhores 300 minutos que o
streaming pôde proporcionar nos últimos tempos. Estão ali todas as características
do humor inglês – a mordacidade, a ironia, a sutileza – elevadas a décima potência.
Phoebe é Fleabag do título (em tradução livre “bagaceira”) e também tudo que o
termo implica: inconsequente, um pouco (vá lá) promíscua, egoísta e sem
qualquer pejo de meter com vontade o pé na jaca, em todos os sentidos possíveis.
Acontece que faz isso de maneira irresistivelmente encantadora e sedutora, dona
total do timing das olhadas e comentários que divide com o espectador, botando
abaixo a quarta parede dramática. Não é uma série de gargalhadas, mas de
sorrisos cúmplices que, de tão verdadeiros e consonantes ao universo de todos aqueles
que se lançam na vida, também dá vontade de chorar. Você adoraria ver comigo. Seis Emmys foram pouco para
tanto talento. Assista no Prime. The series, divided into two short seasons, starring
the inimitable, extraordinary and unexpected sexy Phoebe Waller-Bridge is
definitely the best 300 minutes ever streamed. There, all the characteristics
of the British humor – mordacity, irony, subtleness – to the power of ten. Phoebe
is Fleabag and everything the term implies: inconsequent, a little promiscuous,
egotist, and completely inclined to go to any length in any situation. But she
does all this in an irresistible and seductive manner, totally master of the sneak
timing and the comments divided with the viewer, breaking the dramatic fourth
wall. It is not a show for just laughter, but to be an accomplice to that kind of
smile, so true and so consonant with the universe of those who take the plunge,
that makes us cry. You would love to watch with me. Six Emmys were not enough. Watch
on Prime
O
LEITOR (THE READER, USA, Alemanha, 2008) – Como não amar um
filme cujo um dos temas principais é a leitura de livros? Nos entreatos do
amor, o adolescente Michael (David Kross) lê trechos de romances para Hanna (Kate
Winslet), sem saber que esta experiência literária haverá de modificar a vida
dos dois. Como imaginar o que vai acontecer quando um garoto de 16 anos, com febre,
é ajudado por uma mulher mais velha, na Alemanha ocidental, em 1958? Winslet dá
ao seu personagem uma mistura de compaixão e dureza abrasiva, especialmente quando
transforma seus encontros com Michael em oportunidades tanto redentoras quanto
passionais. E Ralph Fiennes está perfeito como o Michael adulto, especialmente
quando se pergunta como pôde ter amado uma pessoa sobre a qual conhecia tão pouco.
Mas, convenhamos, não é
sempre assim? How not to love a movie whose one of the main themes is book
reading? In the interstices of lovemaking, teenager Michael (David Kross) reads
passages of romances to Hanna (Kate Winslet), unaware that this literary experience
will shape their lives. How to imagine what is going to happen when an older
woman, in West Germany in 1958, helps a feverish 16-year-old boy? Winslet fills
her character with a mixture of compassion and abrasive hardness, especially when
transforms her encounters with Michael into redemptive and passionate moments,
striking a perfect balance between directness and desire. And Ralph Fiennes is
perfect as the adult Michael, especially when he wonders how he could have loved
someone about whom he knew so little. But, let’s face it: isn’t it always like
that?
THE
DRONE (USA, 2019) - Com um
conceito similar a BONECO ASSASSINO, o filme se perde no absurdo de se ter um
drone, assim como um boneco, possuído por um espírito maligno. É a história repisada de bandidos cujos espíritos
invadem objetos inanimados. Então, um casal desavisado acaba adotando ( ! ) o aparelho
e, a partir daí, o drone toca um terror na sua vida. Diálogos fracos e risíveis,
um roteiro que não vai nem pelo horror nem pela comédia, mas que diverte, se
você colocar seu cérebro no modo avião (ou drone). Pelo menos, é um trash assumido. It's a similar concept to that of
Child's Play, except for some reason it feels completely absurd to suggest a
drone could be possessed by an evil spirit and not a doll, which is arguably
the wrong way round. So, it's the old tale of bad guy gets killed and his spirit enters a drone. The
drone is then found by an unsuspecting couple and becomes part of their family
and proceeds to mess up their lives bit by bit. It's packed with cheesy lines and unbelievably silly moments but is in fact
quite fun and also funny. It's probably more of a straight comedy than horror
or thriller so don't expect a dark movie with black humor - it's very light
entertainment, with a few bloody moments but nothing too surprising. Utterly ridiculous but at least self-aware
O
FAVORITO (THE FRONT RUNNER, USA, 2018) – Candidato democrata favorito
para ganhar as eleições presidenciais de 1988, o senador Gary Hart viu todo seu
futuro presidencial desmoronar, após a imprensa descobrir seu romance com a então
modelo Donna Rice, embora ambos, até hoje, neguem que foram amantes. Hugh
Jackman (muito mais bonito que o Hart real) faz o papel do senador mulherengo
com comedimento e propriedade. Vera Farmiga (muito mais bela que a senhora
Hart) explora com dignidade e certa submissão o papel de esposa traída, mas já
sabedora das escapadas do marido. As boas atuações do elenco principal (que
ainda tem o ótimo J.K. Simmons) não estão em sintonia com o roteiro fraco e, até
certo ponto, desnecessariamente confuso e sem sentido. Favorite democratic candidate to win the
presidential elections in 1988, Senator Gary Hart had his political future shattered
by his extramarital love affairs made public by the press. Hugh Jackman (much
more handsome than the real Hart) plays the politician in this famous case of serial
philandering. Vera Farmiga (more gorgeous than Mrs. Hart) plays the role of the
betrayed wife with dignity and submission for she was fully aware of her
husband’s womanizing. Good performances from the leads (besides the great J. K. Simmons), but the screenplay was an
underwhelming convoluted mess of many quick irrelevant scenes that dragged on
into pointless plot issues.
SERENIDADE (SERENITY, USA, 2019) – O filme é muito ruim: atuações
(apesar do bom elenco), roteiro, tudo. Matthew McConaughey esqueceu que ganhou
um Oscar (CLUBE DE COMPRAS DALLAS, 2013) e embarcou numa canoa furada, neste filme
no qual, sintomaticamente, ele é um pescador/gigolô/alcoólatra que hesita
diante do pedido da ex-mulher (Anne Hathaway, loura e sem graça) para matar o atual
dela (Jason Clarke, ciente da estupidez dos diálogos de seu personagem). Basta,
não? E, lamentavelmente, Diane Lane, num papel para lá de secundário e sem
qualquer sentido na trama. The
movie is very bad: performances (despite the good cast), plot, everything. Matthew
McConaughey forgot his Oscar (Dallas Buyers Club, 2013) in his kitchen cupboard
and fell for the role of a fisherman/gigolo/drunk who hesitates when his former
wife (Anne Hathaway, blonde and boring) asks him to kill her present husband (Jason
Clarke, obviously aware of the foolishness of his dialogues). Enough, right? Regrettably,
Diane Lane, in a secondary and senseless role.
CAPITÃ
MARVEL (CAPITAIN MARVEL, USA, 2019) – Fugindo um pouco do esquema
do “filme de origem”, CM agrada, principalmente, por não se levar muito a sério,
como aconteceu com o superestimado MULHER-MARAVILHA. Brie Larson é bonita e talentosa,
além de ter entendido o clima meio gaiato do personagem, e está em ótima companhia
em cena: Samuel L. Jackson e Ben Mendelsohn ajudam o filme fluir com
naturalidade, com um roteiro cheio de humor certeiro e brincalhão. No mais, um
excesso desnecessário de CGI, que é compensado com boas referências vintage dos
anos 90. A little bit out of the “origin
movie” script, CM is quite good, mainly for not taking itself seriously, as it
happens in the overestimated WONDER WOMAN. Brie Larson, beautiful and talented,
understood the unserious mood of the character. Besides, she is sided by two extraordinary
actors – Samuel L. Jackson and Ben Mendelsohn. They help the story flow naturally,
with a witty plot. The unnecessary excess of CGI is compensated with lively
vintage reference to the 90s.
QUESTÃO
DE TEMPO (ABOUT TIME, UK, 2013) – Se você ainda não
viu este filme adorável, em todos os sentidos, você realmente não sabe o que está
perdendo. Richard Curtis, mais uma vez, acerta um raio de vida na nossa alma e
no nosso coração. Além disso, há Rachel McAdams, para nos injetar na veia
aquela dose mais que necessária de esperança num mundo melhor (e mais bonito,
claro). Tim Lake (Domhnall Gleeson, misturando magistralmente doçura e romantismo),
ouve de seu pai (Bill Nighy, grandioso, emocionante) que todos os homens da sua
família podem voltar no tempo e mudar alguma coisa que tenha acontecido na sua vida.
Então, ele conhece Mary (Rachel McAdams) e se apaixona (vem cá, quem não se
apaixonaria?). Como nos filmes de Curtis, os sentimentos mais puros permeiam
toda a história e nos fazem lembrar que nenhuma viagem no tempo é capaz de trazer
de volta o amor de nossa vida e que viver o presente é a verdadeira mágica. If you have not seen this movie, you really do
not know what you are missing. Richard Curtis, once more, makes our heart and
soul be struck by a life lightning. Besides, there is Rachel McAdams to inject
us with that more than necessary dose of hope of a better – and more beautiful -
world. Tim Lake (Domhnall Gleeson, blending masterfully sweetness and
romanticism) is told by his father (Bill Nighy, great, touching) that every man
in their family can travel in time and changes what has happened in their own lives.
Then, he meets Mary (Rachel McAdams) and falls in love with her (be honest: who
would not?). As in all Curtis’ movies, the purest feelings pervade the whole story
and remind us that no time travel can bring back the love of our lives and that
living in the present is the greatest magic.
TÃO FORTE, TÃO PERTO (EXTREMELY LOUD &
INCREDIBLY CLOSE, USA, 2011) – Baseado no livro de Jonathan Safran Foer, o
filme é uma sugestão preciosa de Joe. Com o cenário do pós 11 de setembro, a
história conta a jornada de um menino de 11 anos para manter viva a lembrança –
e a presença – de seu pai (Tom Hanks, magnífico). Está tudo no roteiro: a dificuldade
de se relacionar com o mundo, a sensação dolorosíssima de perder alguém que se
ama muito, a saudade inominável, o esforço para resgatar as recordações, a
necessidade de ouvir e ser ouvido. Sensível, emocionante e, ao mesmo tempo, perpassado
de uma contagiante sensação de esperança. Max Von Sidow toca seu coração sem dar uma palavra. Obrigado, Joe. Based on Jonathan Safran Foer’s book, o film is a
precious suggestion from Joe. With the 9/11 scenario, the story is about an 11-year-old
boy’s journey to keep his father (Tom Hanks, magnificent) alive in his memory. Everything
is in the plot: being an outsider in the world, the painful sensation of losing
someone you love too much, the unnamable absence, the effort to rescue memories,
the need to hear and to be heard. Sensitive, touching and, at the same time, intertwined
with a contagious sensation of hope. Max von Sidow touches your heart without uttering a single word. Thanks, Joe.
YESTERDAY (UK, Rússia, China,
2019) - O roteirista Richard Curtis,
de Quatro Casamentos e Um Funeral, Um Lugar Chamado Notting Hill, Simplesmente Amor e Questão de Tempo, é um apaixonado pelo cinema para
apaixonados, ou seja, gente assim como todo mundo, que ri, chora, sofre, se alegra
e sonha. O longa não é só um tributo aos Beatles,
mas ao poder da gentileza, da honestidade e do romantismo, características
sempre presentes na obra de Curtis. Nesta altura, todos já sabem: depois de
um apagão global, o mundo recomeça com a existência do quarteto de
Liverpool totalmente apagada da história. Jack (Himesh Patel, a cara, o jeito e
até a voz de Raj, de THE BIG BANG THEORY), aparentemente, é o único que ainda
se lembra de Paul, John, Ringo e George e da monumental obra do quarteto. Então,
aproveita a deixa e se passa pelo autor dos sucessos, alcançando a fama
rapidamente. No meio desta história, a doce Ellie (Lily James, mais encantadora
do que nunca) torna-se a referência existencial mais importante para Jack. O filme
é uma homenagem aos Beatles, mas também se presta a uma atitude meio esquecida e
fundamental: o exercício de redescobrir o mundo, como se fosse a primeira vez, todos
os dias, ao passarmos por esta longa e sinuosa estrada. The director/writer Richard Curtis (FOUR WEDDINGS
AND A FUNERAL, NOTTING HILL, LOVE ACTUALLY and ABOUT TIME) is a lover of cinema
for lovers - that is people like us, who laugh, cry, suffer, and dream. The
movie is not only a homage to The Beatles, but also to the power of kindness,
honesty, and romance – traits that are always present in Curtis’ work. By this
time, everyone knows: after a global blackout, the memory of the quartet from
Liverpool is completely erased from history. Jack (Himesh Patel, the face, the
look and even the voice of Raj, from THE BIG BANG THEORY), apparently is the
only person who remembers the Beatles hits. He then pretends to be the author of
the songs, reaching success overnight. In the midst of this, the sweet Ellie (Lily
James, more enchanting than ever) becomes the existential reference for Jack. The
movie is not only a tribute for the Beatles but also rescues a fundamental
attitude: the practice of rediscovering the world with fresh eyes, every day,
while we walk along this long and winding road.