sábado, 4 de agosto de 2018

3111 - BLADE RUNNER 2049

   
   BLADE RUNNER 2049 (USA, 2017) – Maurice, visualmente inebriante, BR2049 nos fisga logo na primeira cena, quando começamos a acompanhar a jornada de K (Ryan Gosling), ao longo deste filme noir futurista, que agregou, com méritos, os elementos essenciais apresentados no filme de Ridley Scott: o questionamento existencial que beira a angústia; o olhar para o outro, com a consciência de que ele também é mais um ser perdido no tempo, como lágrimas na chuva; o futuro hipotético como um espelho que o presente é obrigado a olhar, os altos edifícios de Los Angeles, em meio a uma bruma constante, os carros voadores, as replicantes sensuais e, mais importante ainda, o retorno perfeito de Rick Deckard (Harrison Ford, emocionante), como parte essencial de um roteiro fascinante. Dennis Villeneuve sempre imprime a seus filmes uma identificação pessoal difícil de resistir e que acaba passando na frente de qualquer outro argumento. Foi assim no impactante INCÊNDIOS, no poético A CHEGADA, no dramático SICÁRIO e no instigante O HOMEM DUPLICADO (ao qual você tem a obrigação de assistir), entre outros. A paisagem angustiantemente devastada de BR2049 é uma metáfora da aridez existencial das relações pessoais, cada vez mais mediadas pela tecnologia, nas quais já temos dificuldade de reconhecer quem realmente é humano e não uma contrafação de si mesmo, através de avatares e argumentações estéreis e histéricas. A única diferença é que os replicantes do filme, pelo menos, têm angústias autênticas. Os múltiplos significados da história, com seus símbolos gritantes, passam, neste filme, não pelo foco verbal e, sim, o visual (os olhos estão em toda parte, ora reafirmando, ora disputando a ideia de que eles traduzem o que vai pela alma). Aparecem a discussão da natureza das memórias que nos fazem humanos e a percepção ativa e dinâmica delas: afinal, nossas memórias são nossas porque as vivemos ou porque as inventamos? Há mais: Joi (Ana de Armas, estonteante), a mulher perfeita, ao mesmo tempo intangível e real, como aquelas que sabem estar presentes na mais absoluta ausência; Luv (Sylvia Hoeks, gelada e sexy como um sorvete de manga) sugerindo que o amor pode acabar destruindo a alegria; K (Ryan Gosling, perfeito), um replicante em plena crise de identidade e a repetição proposital de uma instância que raramente nos ocorre e que está contida na relação de K com Joi: ter consciência do outro já supera a materialidade? A falha do roteiro está apenas no efeito Mac Guffin (dicionário, rápido!) representado pelo fato de a reprodução dos replicantes ter uma importância no primeiro ato e que praticamente some no segundo. Mas nada é perfeito, nem seres humanos nem replicantes, muito menos os filmes e livros que amamos, mesmo que o maior defeito deles seja ter um fim. Mas não será mesmo a morte aquilo que dá sentido à vida? ENGLISH: Maurice, visually inebriating, BR2049 catches us right from the beginning, when we start following K’s journey, along this futuristic noir flick. It aggregates, with merit, the essential elements presented in Ridley’s Scott movie: the existential questioning fringing anguish, the look towards the other, with the conscience that he is another soul lost in time, like tears in the rain; the hypothetical future mirroring the present, the high buildings of Los Angeles amidst a constant haze, the flying cars, the sexy replicants and, even more important, the perfect return of Rick Deckard (Harrison Ford) as an essential part of a fascinating plot. Dennis Villeneuve has always printed his movies with a personal touch that is very hard to resist and supersedes the subject. That is what happened with the impacting INCENDIES (2010), the poetic THE ARRIVAL (2017), the dramatic SICARIO (2015) and the instigating ENEMY (2013), among others. The agonizing and devastating landscape of BR2049 is a metaphor for the existential dryness of the personal relationships that are increasingly being mediated by technology. In these individual associations it is already difficult to recognize who is really human and not a simulation of one’s self, through avatars and hysterical and sterile arguments. The only difference is that the replicants of the film, at least, have authentic sorrows. The multiple meanings of the story, with their dazzling symbols, undergo the visual realm. The discussion of the nature of the memories that make us humans and our perception of them comes up: our memories are ours because we experience them or because we invent them?