(SMOKE, USA 1995) - O filme não apresenta uma narrativa muito linear, mas sim uma espécie de vinhetas existenciais sobre oportunidades, a falta de comunicação entre as pessoas e suas trocas afetivas. Harvey Keitel é Auggie, dono de uma tabacaria por onde transitam várias pessoas, cujas vidas, de uma forma ou de outra acabam se interligando. Assim como a fumaça do cigarro - presente em quase todas as cenas - a história parece que vai tomando uma direção errática, até assumir um sentido inesperado, a partir da conversa, já no fim do filme, entre Auggie e Paul, um escritor vivido brilhantemente por William Hunt. Embora não haja nada de particularmente especial em cada um dos sete personagens principais, todos aparentemente egressos de qualquer esquina de Nova Iorque, eles acabam se transformando em uma espécie de heróis urbanos, desses que se tornam quase invisíveis, mas que podem nos tocar definitivamente. O Auggie de Harvey Keitel, por exemplo, é responsável pela cena mais linda do filme, na minha opinião. Ele possui um hábito peculiar: toda manhã, na mesma hora, fotografa a mesma esquina perto de sua loja e arquiva as fotos em vários álbuns. Ele não sabe por que faz isso; só sente que tem que fazer, segundo confessa a Paul, personagem de Hunt, que se espanta: "Mas são todas iguais!". "Não", retruca Auggie, "cada uma é totalmente diferente da outra." E é aí que está talvez a mais importante mensagem do filme: tudo o que importa está bem diante de nós; nós é que temos que ter olhos para poder enxergar o que há de especial e único a nossa volta. SMOKE é um filme transcendental, no qual o belo e o sublime de que nos fala Edmund Burke nos atingem inexoravelmente na observação da existência cotidiana. Abaixo, a belíssima cena na qual Auggie mostra os álbuns a Paul. Emocionante, para dizer o mínimo.