quarta-feira, 14 de agosto de 2013

2115 - O HOMEM AO LADO

(EL HOMBRE DE AL LADO, Argentina 2009) - o cinema argentino continua a dar de 10 a 0 no nosso, principalmente em termos de roteiro. Este filme comprova, mais uma vez, esta afirmação e ainda faz, por vias transversas, uma homenagem ao gênio da arquitetura moderna, Le Corbursier, cuja única casa com sua assinatura está, exatamente, em Buenos Aires. Mora na casa, com esposa e filha, o designer Leonardo (Rafael Spregelburd).
Uma das primeiras imagens que temos de Leonardo é a foto que estampa o seu site oficial. Vive da aparência do sucesso, enfim, esse poliglota de óculos de armação grossa, que desenha e coleciona mobiliário e objetos de vanguarda para combinar com sua casa modernista. O problema, como sempre, são os outros, como diria Sartre. O vizinho, Victor, começa uma reforma e abre na parede que dá vista para a sala de Leonardo um rombo e argumenta que apenas quer uma janela para aproveitar os raios de sol, diz, mas Leonardo surta, acha a janela uma invasão de privacidade. Victor é o típico machão cafona e isso só inflama a cizânia. Desse choque de opostos, típico de comédias sobre vizinhos, o filme tira o seu humor de constrangimento. Victor, por exemplo, por ser um tipo sem meias palavras, é sempre filmado frontalmente. Quando bate à porta de Leonardo, a câmera se coloca no ombro do designer e fica o tempo todo fechada no close-up em Victor. Em oposição, Leonardo "se esconde" da câmera. Em uma das cenas, conversa com a esposa na cozinha e o armário tampa seu rosto. Sua imagem no espelho no quarto da filha se espelha em pedaços. Quando se revela, falando mal de um amigo, Leonardo o faz no escuro. O personagem está cercado de "ruídos" (o kitsch da camiseta do Kiss da empregada e dos passos de dança da filha, por exemplo), mas cria para si uma fantasia clean - que inclusive o impede de lidar de frente com os problemas que não envolvam sua superioridade hierárquica. Como já falei linhas acima, o enquadramento é fundamental e nos dá uma dica preciosa sobre a natureza dos personagens principais: Leonardo em primeiro plano, só sua silhueta, diante do janelão que revela as cores do parque arborizado ao fundo. Essa forma como os diretores enquadram o personagem e o exterior é essencial para entender o isolamento, travestido de bem estar, que as pessoas se impõem hoje em nome de uma suposta segurança. O Homem ao Lado homenageia, no fim, não a arquitetura de Le Corbusier e sua defesa da funcionalidade, mas seu senso de urbanismo, além de nos levar a uma reflexão sobre as relações nem sempre humanas entre pessoas que vivem próximas.