Amy Adams, num ensaio sobre a beleza e a feiura represada |
ANIMAIS NOTURNOS (NOCTURNAL ANIMALS, USA
2016) – Tom Ford, além de diretor, é designer e magnata da
moda. Tal currículo o faz ter um apreço exacerbado pela estética, quase como
uma obsessão que, contida, emerge, aqui e ali, quando menos se espera. É assim
que ele apresenta ANIMAIS NOTURNOS: como um desfile de sentimentos e impressões
que, a cada mudança de roupa/cena/personagem, explode no cultivo do belo, do
simétrico, do “clean” total, do perfeito, do rarefeito. É exatamente aí que ele
joga com uma certa ambiguidade – na beleza aparentemente equilibrada da vida da
galerista Susan Morrow (Amy Adams, excelente), escondem-se feiuras que o tempo
tratou de reprimir. Quando recebe um livro escrito pelo ex-marido Edward (Jake
Gyllenhaal) e começa a lê-lo, Susan vai percorrendo um caminho que a deixou
anestesiada pela culpa. Os tons narrativos vão se superpondo, como tecidos
diáfanos sob a roupagem principal. Gosto, sobretudo, de filmes que têm livros
como elementos da história. E é através da leitura de Susan que os fantasmas,
dela e de Edward, reaparecem dando novo significado à história interrompida de
suas vidas. É um filme que se equilibra entre a abordagem cerebral e o açulamento
das emoções represadas pela culpa e a vingança. O espetacular Michael Shannon
aparece como um policial cujo oblíquo código moral dá ao roteiro – e aos personagens
- uma válvula de escape inesperada.