quarta-feira, 31 de janeiro de 2018

3039 - FERIAS FRUSTRADAS EM VEGAS

   
   FÉRIAS FRUTRADAS EM LAS VEGAS (VEGAS VACATION, USA 1997) – Este quarto filme dá continuidade à saga da família Griswald, liderada com absoluta naturalidade pelo chefe do clã, Clark Griswald (Chevy Chase). O primeiro “FÉRIAS FRUSTRADAS” acertou em cheio no humor descompromissado, politicamente incorreto, sem a pretensão de apresentar um humor inteligente. As sequências foram desgastando esta premissa, até que só restasse um arremedo pouco original, com gags recicladas e desinteressantes. Ainda vale uma olhada, principalmente por causa do simpático Chase e do seu esforço para que sua família e nós, os espectadores, tenhamos bons momentos de diversão.

3038 - BLACK MIRROR - TEMPORADA 2

   
BLACK MIRROR (TEMPORADA 2, 2013) – Mais uma excelente antologia de contos perturbadores explorando o lado negativo da tecnologia e suas consequências nas relações humanas. O primeiro – BE RIGHT BACK - fala da dependência emocional de uma viúva que não aceita a morte do marido e usa um aplicativo que emula a movimentação dele em redes sociais. Uma crítica certeira à incapacidade das pessoas de ficarem sozinhas. O segundo – WHITE BEAR – gira em torno de uma mulher que acorda em uma casa sem qualquer memória do que lhe aconteceu e passa a ser perseguida por pessoas empunhando seus celulares. Aí está outra demonstração da dependência do celular, aspecto também presente no primeiro episódio. Em THE WALDO MOMENT, um personagem de animação, o ursinho Waldo, ganha o eleitorado de um candidato conservador, com uma proposta de comunicação mais direta com a população. No último, WHITE CHRISTMAS, dois homens relatam histórias relacionadas com a tecnologia que terminam de forma inesperada, e como estes fatos os levaram a se afastar da humanidade.

3037 - PLANETA DOS MACACOS - A GUERRA

     
Andy Serkis, magnífico
PLANETA DOS MACACOS A GUERRA (WAR FOR THE PLANET OF THE APES, USA 2017) – Não chega perto do original, de 1968, com Charlton Heston, mas este filme é realmente benfeito e com um arco dramático que faz referências explícitas aos genocídios e ao terror de forma tão contundente, que não há como fazer uma profunda reflexão sobre a natureza humana. Algo que tem a ver com a “banalidade do mal” de que falava Hannah Arendt perpassa o roteiro deste terceiro episódio da série iniciada em 2011. É um filme tenso, sofrido e extremamente estimulador à consciência dos elementos constitutivos das relações entre dominantes e dominados. Tecnicamente, é uma produção primorosamente espantosa. A “performance capture” é de um nível tão alto que beira a perfeição: é assim que Andy Serkis, numa atuação impecável, transmite, com suas expressões faciais, a dor e o sofrimento cósmico que Cesar, o símio que lidera o imenso contingente de macacos acuados em guetos naturais. É notável o assombro e a desilusão que brotam dramaticamente dos olhos de Cesar, diante do cortejo de horrores provocado pela violência do homem em relação ao seu povo. É um retrato de um retrocesso civilizatório inevitável, resultado, sobretudo, da ânsia de poder e da falta de diálogo. É, de longe, muito melhor do que os dois filmes anteriores.

terça-feira, 30 de janeiro de 2018

3036 - A FORMA DA ÁGUA

  
  A FORMA DA ÁGUA (THE SHAPE OF WATER, USA 2017) – A premissa, de tão simples e inusitada, é chocante: uma faxineira muda e uma criatura anfíbia presa em um laboratório se apaixonam. O diretor Guillermo de Toro, com este filme, mostra, entre muitas outras coisas, que o amor, em muitos casos, principalmente nos mais insólitos, não conhece limites. Mas A FORMA DA ÁGUA não é apenas isso. As camadas epistêmicas do roteiro são tão numerosas quanto as escamas do ser que, na memória afetiva dos espectadores, evoca o do clássico B O MONSTRO DA LAGOA NEGRA, de 1954 e também faz referência aos elementos de A BELA E A FERA. Contudo, Del Toro subverte as convenções que caracterizam histórias em que monstros se encantam por belas mulheres, fazendo exatamente o contrário: é Elisa (Sally Hawkins, estupenda) que se aproxima romanticamente da criatura que, por sua vez, assume o papel de mocinho da história. Ou seja, neste caso, a “fera” não precisa se transformar para realizar seu amor. A metáfora líquida está sempre presente. Eliza, aparentemente frágil e desprotegida, mostra que seu amor é como a água – pode ser contido, mas, uma vez liberado, flui incontrolavelmente. Assim sendo, o amor tem a conformidade da água, que assume a forma do seu continente. Destarte, o amor pode ter muitas formas. Não há como não se lembrar do belo poema de João Cabral de Melo Neto, A IMITAÇÃO DA ÁGUA. Aliás, atenção para o poema na sequência final. Há referências religiosas (Sansão e Dalila, com uma interpretação inusitada, a deidade da criatura na sua origem etc) e cinematográficas (além das já citadas, O CORCUNDA DE NOTRE DAME e KING KONG, claro). No elenco, Octavia Spencer, sensacional, e o grandíssimo Richard Jenkins, numa atuação memorável (e quando não é?). Michael Shannon, fantástico, mais uma vez, personifica o antagonista, mas com tanta profundidade que talvez merecesse um filme só para si. Assim sendo, não é à toa que a produção seja favorita ao Oscar deste ano. Definitivamente, A FORMA DA ÁGUA é um filme que te fisga ao primeiro fotograma. Portanto, quando a oportunidade vier, vá e mergulhe na experiência. Você encontrará mágica.  

3035 - KINGSMAN: O CÍRCULO DOURADO

  
   KINGSMAN: O CÍRCULO DOURADO (USA/UK, 2017) – O primeiro filme apostava na violência exageradamente simbólica (como em KIL BILL) e era deliciosamente debochado, oxigenando um gênero de ação que, em outras produções, apresentava algumas fissuras na originalidade. Colin Firth estava à vontade, à frente dos Kingsmen, agentes secretos que usam como fachada uma alfaiataria na Savile Row e adotam codinomes inspirados nas lendas da Távola Redonda. Nesta continuação, tudo vai por água abaixo. Quando passamos a prestar atenção nos “cameos” de atores famosos que aparecem só para uma pontinha, como é o caso aqui, é sinal de que algo vai mal. Situações de mal gosto (hambúrgueres feitos de carne humana???), um cantor pop de fama mundial se limitando a xingar cada vez que aparece em cena (Elton John precisava disso?), CGIs aquém do esperado e tentativas fracassadas de humor inteligente num roteiro confuso, disperso e incapaz de explorar os saudáveis absurdos do universo dos tradicionais agentes secretos britânicos. Tudo muito ruim. 

domingo, 28 de janeiro de 2018

3034 - TINHA QUE SER ELE?

     
TINHA QUE SER ELE (WHY HIM? USA, 2016) – Esta é uma daquelas comédias que caminham perigosamente na linha que limita o remotamente engraçado com o mau gosto inevitável. O normalmente sensato James Franco se arrisca num papel de nerd inconsequente e milionário do Vale do Silício, noivo de uma menina certinha, cujos pais tradicionais e caretas vão, claro, ter um baita choque cultural quando ela leva os pais para conhecer o futuro marido. O roteiro tenta explorar as diferenças comportamentais entre sogros e genro e despeja uma avalanche de situações escatológicas, desenxabidas e forçadas, sempre exagerando na crença infundada de que o excesso de palavrões gera humor automaticamente. O bom elenco – além de Franco, o ótimo Brian Cranston (de BREAKING BAD) – faz o que pode com o material rasteiro que recebe.

3033 - FEITO NA AMÉRICA

   
Tom Cruise, no rumo certo
 
FEITO NA AMÉRICA (AMERICAN MADE, USA 2017) – Tom Cruise revive a trajetória alucinada de um piloto de avião que se viu no meio de traficantes de drogas e conchavos do governo americano, que procurava um sujeito com seu perfil safo para transportar armas para os Contras, os milicianos que combatiam a revolução de esquerda sandinista instaurada em 1979 na Nicarágua. Acabou recebendo a proposta do cartel de Medellin para, na volta aos EUA, carregar drogas no compartimento que, na ida, viera atochado de armamento. O diretor Dough Liman – de A IDENTIDADE BOURNE e NO LIMITE DO AMANHÃ – imprime à narrativa uma tal efervescência e velocidade, que a torna irresistível. Principalmente por se tratar de fatos reais pautados por uma liberdade e aventura que não teriam mais lugar no mundo de hoje. O filme também acerta ao trazer de volta o Tom Cruise dos bons tempos em que se comprazia em viver um tipo de anti-herói que encantava pela ousadia e inconsequência juvenil, apesar dos 55 anos. O filme é uma montanha-russa de ações inacreditáveis, do começo ao fim, com o pano de fundo da corrupção e da política internacional e uma inesperada, mas bem-vinda, abordagem bem-humorada. 

sexta-feira, 26 de janeiro de 2018

3032 - COMEDIANS IN CAR GETTING COFFEE

     
Seinfeld e Obama, na Besta
COMEDIANS IN CAR GETTING COFFEE (USA, 2012) – Há vários destaques nesta divertidíssima série comandada por Jerry Seinfeld. O título já diz tudo, e não há necessidade de mais nada: são entrevistas reveladoras com comediantes americanos durante uma volta de carros (e que carros!) com Seinfeld, até a parada obrigatória para um café em alguma “coffee shop” fashion de Los Angeles. A edição ágil dá um ritmo leve que parece nos colocar no banco de trás de uns dos carrões usados por Jerry, ou à mesa, entre aromas e risos. Há vários destaques: Michael Richards, David Letterman, Don Rickles, Carl Reiner, Steve Martin, entre outros. Atenção para a entrevista que ele faz com Obama, realizada na Casa Branca, por motivos óbvios. Obama é o entrevistado perfeito: charmoso, inteligente, com oratória perfeita e sutilmente engraçado. A presença dele no programa do Letterman, MY NEXT GUEST NEEDS NO INTRODUCTION, é também um momento de perfeição. 

quinta-feira, 25 de janeiro de 2018

3031 - CORRA QUE A POLÍCIA VEM AÍ!

Leslie Nielsen, mais engraçado impossível
    CORRA QUE A POLÍCIA VEM AÍ (THE NAKED GUN: FROM THE FILES OF POLICE SQUAD!, USA 1988) – Sempre é muito bom rever Leslie Nielsen, especialmente quando ele está na pele do desastrado detetive Frank Drebin neste primeiro filme baseado na série de TV POLICE SQUAD. Já tendo sido um destaque hilariante em AIRPLANE!, outro clássico do time ZAZ (Zucker, Abrahams, Zucker), Nielsen está mais do que à vontade no papel que ele faz da maneira mais séria possível, o que deixa tudo mais engraçado. O grande George Kennedy contribui para o equilíbrio do roteiro com uma atuação afinada com as birutices de Dreblin, Ricardo Montalban, nosso Khan, é ótimo vilão da vez e Priscilla Presley faz bem o contraponto amoroso do protagonista, por mais improvável que seja o casal. O absurdo e o “nonsense” permeiam o filme desde a primeira sequência até os créditos finais. As piadas não são inteligentes. Não eram para ser mesmo. São apenas engraçadas no seu sentido mais primal. Por isso, o filme é um clássico.   


terça-feira, 23 de janeiro de 2018

3030 - A BELA E A FERA

   
Emma Watson, além de Harry Potter
  
A BELA E A FERA (THE BEAUTY AND THE BEAST, USA, 2017) – Estrelado por uma cativante Emma Watson, exultando graça e donaire, além de uma autoconfiança mesmerizante, o filme é uma retomada da Disney ao sucesso, agora apostando nas animações ressuscitadas como “live action”, com atores de carne e osso. Há uma leveza contagiante nesta produção oxigenada com bons efeitos (que não funcionam nas externas) e canções pertinentes ao roteiro (coisa rara em musicais, diga-se). Por outro lado, as atuações, em geral (à exceção de Emma Watson e Kevin Kline) ficaram um pouco forçadas em função da abordagem de cartum adotada pelo diretor Bill Condon. Isso fica claro no núcleo “village people”, no qual parece ter havido sérias restrições orçamentárias nos figurinos e no set propriamente dito.  

3029 - LOVING

   
Negga e Edgerton, notáveis
   
LOVING (USA, 2016) – História real de Richard e Mildred Loving, um casal cuja prisão por casamento inter-racial, na década de 60, na Virgínia, deu início a uma longa batalha legal que terminaria numa decisão histórica da Suprema Corte em 1967. O filme é belíssimo! Joel Edgerton e Ruth Negga têm uma atuação emocionante, com uma química perfeita em cena, nos fazendo sentir como se estivéssemos assistindo ao casal verdadeiro. Esse é um daqueles filmes que, ao final, mostram fotos dos personagens reais, e é aí que se tem a exata noção do absurdo do preconceito racial nos EUA naquele momento. Um registro importante: Edgerton e Negga estão em cena com pouquíssimas palavras e conseguem passar todo o drama por que passaram com uma força impressionante. É isso que caracteriza os grandes atores. Edgerton já tinha dado provas disso, atuando e dirigindo.   

segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

3028 - ESCONDIDOS

    
 ESCONDIDOS (HIDDEN, USA, 2015) – A grife dos irmãos Duffer (de STRANGER THINGS) logo me chamou a atenção. Este é um dos filmes que quanto menos você souber do roteiro melhor. Não uma ação grandiosa nem aqueles elementos que poderiam caracterizar um filme de suspense, terror ou ficção científica. HIDDEN é uma mistura destes gêneros, mas também não é nada disso. Parece um daqueles filmes do M. Night Shyamalan, só que bem feito. No elenco, o sueco Alexander Skarsgard, de TRUE BLOOD e TARZAN, mostra, mais uma vez competência no controle nórdico de suas emoções. O ambiente claustrofóbico pós apocalíptico funciona mais pela direção e roteiro do que pelos acanhados efeitos especiais que, no fundo, nem são tão necessários assim. 

domingo, 21 de janeiro de 2018

3027 - MEU NOME É JEEG ROBOT

   
   MEU NOME É JEEG ROBOT (THEY CALL ME JEEG, Itália, 2015) – Este é um estranho, mas legal, filme italiano de ficção científica, misturando elementos políticos com referências aos heróis de mangá. Enzo (Claudio Santamaria), cai num rio poluído de Roma e, devido aos componentes radiativos ali descartados, se vê com poderes excepcionais. Sem valores éticos, ele passa por outra transformação, ao se apaixonar por uma moça aficionada pelo mangá JEEG ROBOT: misantropo, a princípio, começa a ter uma consciência mais solidária e, aos poucos, vai personificando o super-herói japonês. O filme dá uma caída no entrecho intermediário, no entanto, cresce na sua parte final. Há uma crítica bem contundente à situação política da Itália, às contradições do desenvolvimento que provoca uma perigosa poluição, aos “reality shows” e à vida superficial de uma geração supostamente antenada nas redes sociais. 

3026 - DEADPOOL

  
Reynolds, no papel certo...
    
DEADPOOL (USA, 2016) – O filme é realmente muito divertido, além de possibilitar uma curtição extra: ficar atento para as referências cinematográficas que pululam ao longo do roteiro escrito sem pudores por Rhett Reese e Paul Wernick. Além disso, é o “turning point” na carreira de Ryan Reynolds. Ele, de fato, está à vontade na pele castigada deste herói que eleva o politicamente incorreto ao patamar mais nobre jamais visto no cinema. Suas falas são engraçadas – faz troça até com o próprio Reynolds – e, surpreendentemente, preenche as cenas com uma fisicalidade estonteante, acompanhada de uma narrativa não linear que cativa a partir da estupenda sequência inicial. Seu destino romântico, Morena Baccarin, nunca esteve tão bonita num filme e está perfeita como o personagem que resgata os sentimentos do anti-herói e ainda dá um novo sentido à expressão “olhos oblíquos”. O grande destaque é mesmo para as falas hilariantes, quase todas costuradas inteligentemente com referências pop – portanto, quem não anda ligado no que acontece no mundo não vai entender metade das tiradas. Não há uma piada que não funcione. As sequências de ação são muito bem filmadas e nos remetem ao estilo de Tarantino, sem o irritante recurso das “shaky-cams” que infestam tantas outras produções. A ousadia de um filme assim mostra que vale a pena ter coragem para romper com certos paradigmas que tanto engessam criativamente muitos dos lançamentos recentes. DEADPOOL: o diretor é ótimo, Reynolds é fenomenal e o script fantástico.  

sexta-feira, 19 de janeiro de 2018

3025 - O LAR DAS CRIANÇAS PECULIARES

   
Eva Green e Asa Butterfield
LAR DAS CRIANÇAS PECULIARES (MISS PEREGRINE’S HOME FOR PECULIAR CHILDREN, USA/INGLATERRA/BÉLGICA, 2016) – Como em todo filme de Tim Burton, aqui o mundo adulto é um pote até aqui de mágoas e um lugar traiçoeiro, onde a fantasia é vista como ameaça à ordem. A partir daí, Burton vai costurando lembranças, traumas, desilusões numa narrativa que vai acumulando o desajuste e o isolamento com obsessões visuais que remetem a um delírio de Salvador Dali. Jake (Asa Butterfield, com atuação aquém da expectativa) sempre acreditou nas histórias do avô, Abe (Terence Stamp), que morreu recentemente. A mais extraordinária dá conta de um estranho orfanato que sobreviveu aos bombardeios da guerra, e onde um grupo de crianças com poderes extraordinários, sob os cuidados de Miss Peregrine (Eva Green, mesmerizante, como sempre), vive isolado do mundo. Jake encontra uma forma de volta ao passado e visitar o lugar, ao mesmo tempo em que vai reconstruindo emocionalmente os danos que a falta do avô lhe causou. Assoma-se, em certo momento uma história com a leveza e a graça dos antigos trabalhos de Burton, sem, porém, a corrente anímica que o levou, com méritos, ao panteão dos grandes diretores contemporâneos. 

3024 - O PIANISTA

A dor
    O PIANISTA (THE PIANIST, USA, França, UK, 2002) – Roman Polanski é o responsável pelo retrato cinematográfico desta história de sobrevivência em meio aos horrores da II Guerra Mundial. O talentosíssimo Adrien Brody faz o papel do pianista judeu Wladyslaw Szpilman que, com sua família levada para os campos de concentração, faz de tudo para sobreviver no Gueto de Varsóvia em ruínas. Sua atuação é, no mínimo, comovente. É impressionante como ele consegue representar uma situação tão dramática através de longos silêncios (característica dos grandes atores). E o olhar. Raramente se encontra um olhar como o de Brody. Poder-se-ia fazer um filme inteiro apenas com o close-up dos seus olhos. O filme é imensamente triste, poético (é tocante a cena em que Szpilman, sem poder fazer barulho no apartamento em que está escondido, apenas movimenta os dedos sobre o teclado do piano, com a música tocando na sua cabeça), trágico e verdadeiro – quem nunca viu uma guerra de perto, pode ter a noção muito próxima do que é sobreviver num inferno. Clássico, em todos os sentidos. 

3023 - MENTE CRIMINOSA

   
Costner, meio perdido
 
MENTE CRIMINOSA (CRIMINAL, USA, 2016) – Este é um filme estranho. O elenco chama a atenção logo de cara: Kevin Costner, Tommy Lee Jones, Gary Oldman (o provável ganhador do Oscar este ano) Ryan Reynolds e Gal Gadot (supervalorizada por MULHER MARAVILHA, mas vá lá). Mas o filme não engata. Um dos fatos que comprometem o resultado final é a escalação de Costner para o papel de um condenado perigoso, apesar do seu esforço louvável. Para piorar, com uma voz gutural que não convence. Na história, ele tem as lembranças de um agente da CIA (Reynolds), morto numa missão, implantadas na sua mente e precisa resolver os problemas decorrentes desta situação inusitada.

quinta-feira, 18 de janeiro de 2018

3022 - A ORQUÍDEA NEGRA

  
Quinn e Sophia Loren, encantadores...
   
A ORQUÍDEA NEGRA (THE BLACK ORCHID, USA 1959) – O diretor Martin Ritt conduz esta história num ritmo meio de novela, mas que acaba funcionando em função dos excelentes protagonistas: Anthony Quinn e Sophia Loren. Eles são Frank e Rose, dois viúvos que têm que convencer os respectivos filhos de que seu casamento tornará melhor as vidas de todos. A fotografia evocativa em preto e branco realça a ambientação para o romance de Frank e Rose. Sophia Loren, com apenas 23 anos, mostra que era mesmo uma ótima atriz no papel de uma viúva muito mais velha – tanto que seu filho no filme era apenas 11 anos mais novo que ela. Anthony Quinn, com toda sua figura solar, é um dínamo dramático que estabelece logo de cara uma empatia irresistível com o espectador.

quarta-feira, 17 de janeiro de 2018

3021 - A QUALQUER CUSTO

Jeff Bridges, soberbo
1   A QUALQUER CUSTO (HELL OR HIGH WATER, USA 2016) – Ver Jeff Bridges em cena é um privilégio. Sua capacidade de preencher a cena usando todos os matizes dramáticos possíveis faz dele um ator abertamente sulfúrico. Tem sido assim em vários filmes: CORAÇÃO LOUCO, SEM MEDO DE MORRER, O SUSPEITO DA RUA ARLINGTON, entre tantos. Também é assim neste faroeste clássico no corpo e profundamente contemporâneo na alma. Para resumir: é um daqueles filmes que não se pode perder. Dois irmãos assaltantes de banco (Chris Pine e Ben Foster) são perseguidos pelas empoeiradas estradas do Texas por uma figura típica do “western” – o velho homem da lei em sua última missão (Bridges, magistral). Tudo transcorre de acordo com o figurino do faroeste na sua forma tradicional, mas o diretor David Mackenzie (do excepcional SENTIDOS DO AMOR) vai muito mais além: enreda elementos do passado com as agruras mais contemporâneas (a recessão econômica e a ganância corporativa), inserindo, em cada sequência, espaço suficiente para a reflexão, tanto dos personagens como dos espectadores. Ao fim, somos todos atingidos pela imprevisibilidade do ser humano em face da preservação dos ideais que formatam a vida. E, claro, há Jeff Bridges em cena. 

segunda-feira, 15 de janeiro de 2018

3020 - HERANÇA DE SANGUE

   
Um filme com sabor de Mel...
   
HERANÇA DE SANGUE (BLOOD FATHER, USA 2016) O filme não é excelente, mas dá para assistir sem sono. Além disso, é bom ver Mel Gibson reerguendo a carreira e de novo em forma (fisicamente, inclusive). O roteiro nada tem de original: John Link (Gibson), ex-alcoólatra e vivendo à margem da sociedade num trailer no meio do deserto (referência ao Martin Riggs, de MÁQUINA MORTÍFERA?), há anos não está com a filha adolescente que fugiu da casa da mãe para viver com um bandido (Diego Luna, meio exagerado). Quando ela se vê em apuros, procura pelo pai e o coloca na maior roubada, pois está sendo perseguida pela gangue do namorado. Mas o que vale aqui é a forma como Gibson agarra o papel: visceral, ele dosa os ímpetos matadores advindos do seu tempo de Mad Max com a ternura e o arrependimento de um pai ausente e que deseja recuperar o tempo perdido com a filha. Sem medo de mostrar as profundas rugas em seu rosto, seu John Link poderia muito bem ser um "link"com sua carreira, cujo começo alvissareiro e posterior sucesso mundial foram interrompidos pelo álcool e um comportamento, no mínimo, politicamente incorreto. Neste filme, ele parece amalgamar a raiva psicótica de Riggs e Max com a calma controlada da meia-idade, quando tudo parece dar errado. Outro destaque é para Erin Moriarty, que esteve no sensacional CAPITÃO FANTÁSTICO.

domingo, 14 de janeiro de 2018

3019 - STRANGER THINGS - TEMPORADA 2

   
     STRANGER THINGS 2 (USA, 2017) – Se a primeira temporada de STRANGER THINGS já se esmerava na irresistível mistura de nostalgia e viço inovador, seus criadores, os irmãos Matt e Ross Duffer, redobram a aposta nesta nova leva de capítulos. Como resultado, tivemos, em 2017, as melhores 9 horas que a TV pôde produzir. Os personagens crescem nos seus respectivos arcos dramáticos, depois de uma primeira temporada para lá de promissora. A lentidão analógica dos anos 80, em vez de ser apenas um apelo nostálgico, serve como caldo de referências que reforça o apelo para as novas gerações. David Harbour continua sendo um destaque no ótimo elenco, mas quem cativa mesmo é a menina Millie Bobby Brown, que vive Eleven numa intensidade e empatia poucas vezes vista no cenário cinematográfico. Emparedada entre as dores do crescimento e as ameaças que emanam de uma dimensão paralela habitada por monstros, Eleven/Millie é a melhor surpresa de 2017. ST é um gracioso caleidoscópio de reviravoltas que, antes de mergulhar numa nostalgia repetitiva, nos traz aspectos que, para muitos, passaram despercebidos numa década em que éramos estranhamente felizes sem celulares, internet e redes sociais. 

3018 - VINGANÇA

1.    
Cage: este cabelo não lhe faz favor algum
  
VINGANÇA (VENGEANCE, A LOVE STORY, USA 2017) – Sou um fã “die-hard” de Nick Cage. Sei que ele tem feito uma série de filmes ruins ultimamente (à exceção do intenso JOE, de 2013), mas sempre tenho a esperança de que ele vai nos surpreender. Achei que isso ia acontecer com este filme, mas não. O roteiro é ruim e sem qualquer laivo de originalidade – um policial veterano da Guerra do Golfo se vinga dos estupradores de uma mãe solteira. Mais ou menos o que Charles Bronson fazia na série DESEJO DE MATAR, há 40 anos. Tecnicamente, o filme peca numa edição lamentável – cenas longas demais que em nada ajudam a suportar a mão pesada do diretor Johnny Martin. Destarte, continuamos a esperar que Cage volte a ter bons papéis. E isso é possível (vide JOE). Quem sabe Tarantino o recupere em algum de seus filmes inesperados? 

sexta-feira, 12 de janeiro de 2018

3017 - O SUSPEITO DA RUA ARLINGTON

    
Hope Davis e Jeff Bridges
1.     SUSPEITO DA RUA ARLINGTON (ARLINGTON ROAD, USA 1999) – A primeira cena é impactante e dá o tom deste ótimo filme: o professor de História, Michael Faraday (Jeff Bridges, colossal) socorre uma criança com a mão estraçalhada que vaga por uma rua deserta.  Apenas três anos antes do 11 de setembro, este thriller mostra a paranoia do terrorismo doméstico nos Estados Unidos. Michael, já traumatizado com a morte da mulher, uma agente do FBI, encasqueta que seu vizinho (Tim Robbins, todo misterioso mesmo) é um terrorista e, a partir daí, tenta de todas as formas provar suas suspeitas. Jeff Bridges mostra, mais uma vez, que é um ator que redimensiona seus personagens a um nível eletrizante, levando-nos junto com seu “drive” emocional. É como se ele estivesse fazendo o último papel da sua vida – é só lembrar de CORAÇÃO LOUCO (2009), HELL OR HIGH WATER (2016), STARMAN (1984), que se pode sentir o ímpeto visceral que ele mostra em cena. Neste filme, ele vai incorporando a obsessão pela verdade escondida nos desdobramentos da história, até ao máximo paroxismo. Destaque, no elenco, para a bela Hope Davis e Joan Cusack.  



quarta-feira, 10 de janeiro de 2018

3016 - O TÚNEL

Jung-Soo, preso no túnel
1    O TÚNEL (TEO-NEOL, Coreia do Sul, 2016) – Jung-Soo dirige tranquilo na estrada quase vazia e sua única preocupação é chegar a tempo para a festa de aniversário da filha. Eis o cenário perfeito para anteceder uma grande tragédia, ou quase isso: o túnel recém-inaugurado que ele atravessava em seu carro (belo merchandising da KIA) literalmente desaba sobre ele. Sem nenhum ferimento grave, mas confinado por toneladas de escombros, imprensado entre as ferragens do carro e atordoado, Jung-Soo ainda não percebeu a gravidade da situação. Pelo celular (Samsung, claro), descobre que as equipes de resgate não têm a menor ideia de que ponto do túnel ele está preso. A espera de socorro pode levar dias, talvez semanas, sem garantia alguma. É aí que o excepcional cinema sul-coreano produz mais um exemplar da sua vitalidade e imensa criatividade: do contraste entre a solidão enlouquecedora do protagonista no interior do túnel e a confusão de autoridades, policiais e jornalistas, emerge uma crítica ácida ao governo, que só quer faturar politicamente com o incidente, e à espetacularização que a mídia promove em situações como esta.  

terça-feira, 9 de janeiro de 2018

3015 - STAR WARS - OS ÚLTIMOS JEDI

1    
Daqui para frente, tudo poderia ter sido diferente...
STAR WARS – OS ÚLTIMOS JEDI (STAR WARS: THE LAST JEDI, USA, 2017) – Depois da emoção incontida e coletiva provocada pela última cena de O DESPERTAR DA FORÇA, quando Rey (Daisy Ridley) se vê finalmente diante de Luke (Mark Hammil), numa cena visceralmente surpreendente, que conseguiu unir o universo (em todos os sentidos) do ciclo canônico iniciado nos anos 70 com a proposta de um novo panteão de personagens e a oxigenação da trama que parecia ter se perdido nos três filmes intermediários, era de se esperar que o diretor Rian Johnson aproveitasse a chance de realizar um grande filme que, pelo menos, se ombreasse com a obra-prima de J.J. Abrams. Só que não aproveitou. A emoção, pura, pulsante, perfeita, estava pronta para fisgar tanto o espectador comum quanto o o fã mais radical, mas Johnson resolveu ir por um caminho diferente e, nem por isso, melhor. Num didatismo meio forçado, submete o público a uma avalanche de minúcias, numa abordagem explicativa que põe sempre em risco a magia de uma história que nunca precisou explicar, por exemplo, o que era Força. A Força é a Força, pronto! Não é para ser explicada, entendeu? Ao detalhá-la, Johnson se assemelha a um time de futebol que, de tanto se defender, acaba fazendo um gol contra. Sim, ele é um diretor medroso e, indesculpavelmente, destituído de talento e sensibilidade, ao não valorizar a ingente expectativa que o filme anterior gerou. Ele demora a fazer a movimentação dos personagens, exagera nas longas sequências dedicadas a subtramas desimportantes e desperdiça imaturamente um capital emocional cultivado ao longo de décadas (e isso não se compra num supermercado) para, por exemplo, esvaziar a pungência de algumas cenas – Carrie Fisher merecia muito mais, convenhamos. Ao revisitar personagens pivotais, como Yoda, na constrangedora cena com Luke, o diretor compromete não só a história que tinha em mãos, mas também fere de morte as referências afetivas que se construíram em torno destas figuras. Os CGIs continuam excelentes, porém parecem apenas servir como camadas diversionistas para um miolo insatisfatório. Talvez esta sensação se esvaia com o tempo, e o filme passe a ter um significado mais próximo à enorme expectativa que o filme VII estabeleceu. Agora, além do niilismo temático, fica-nos o abismo gnóstico de tudo aquilo que poderia ter sido e não foi. Johnson teve a chance de resumir, na mesma narrativa, todos os “motifs” que o universo de STAR WARS foi acumulando ao longo de tantos anos. Ele preferiu, despudoradamente, expor ao público a cicatriz que sua falta de talento produziu. Isso causou, entre outros aspectos, um predicamento incontornável – até Rey (Daisy Ridley, ainda ótima, mas sem ser a atriz catalisadora do primeiro filme) não consegue reencontrar o Luke que vivia no inconsciente coletivo de todos que optaram, um dia, pela Força, sem precisar entendê-la “in totum”. Um diretor despreparado como Johnson, ao tirar o filme VIII dos trilhos que J. J. Abrams havia habilmente preparado em O DESPERTAR DA FORÇA, inviabiliza, por inépcia, os axiomas que sustentam e legitimam a expectativa natural de três gerações, tal como a busca de uma motivação que apenas existe, inquestionavelmente, e permanece em função da magia do cinema, ao perpetuar a arte de contar uma história. Mesmo que este relato tenha lá seus defeitos. Afinal, mesmo um relógio quebrado marca a hora certa duas vezes por dia. Perdeu-se, portanto, a chance de uma abordagem mais hamletiana, na qual a devastadora consciência dos personagens (Luke? Rey?) determinasse, por si só, que a história que todos nós amamos caminhasse descalça pelo arame farpado do clichê e do acanhamento artístico, corajosamente, naturalmente, no presente, no passado e no futuro, em uma galáxia muito, muito distante, com imperfeições, certamente, mas todas elas pertencentes à saga e não a um diretor claramente limitado. Algo digno de STAR WARS, enfim. Como todos esperavam... 

segunda-feira, 8 de janeiro de 2018

3014 - VIDA

     
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VIDA (LIFE, USA, 2017) – Espécie de mistura de GRAVIDADE com ALIEN, VIDA traz uma tripulação de uma estação espacial que cede ao fascínio de sua descoberta estupenda: uma célula solitária marciana que sobreviveu a um resgate de uma sonda que trazia amostras colhidas no planeta vermelho. Mas o filme do diretor sueco Daniel Espinosa tem um roteiro ruim, que leva os personagens a tomarem decisões improváveis para uma equipe cuja missão é explorar o espaço dentro de parâmetros de segurança aceitáveis. PROMETEUS e ALIEN - CONVENANCE têm, aqui, um competidor à altura, em termos de precariedade de roteiro. Os diálogos, repletos de clichês, chegam a ser constrangedores de tão pedestres. Além disso, as cenas, não raro, insultam qualquer inteligência mediana. Por exemplo: pegar no espaço uma sonda desgovernada, vindo em sua direção, com um braço mecânico, como se fosse uma bola de beisebol, sem qualquer alteração geoestacionária da estação, pelo menos, parece um pouco improvável. Ou seja, em cinco minutos, a ciência é jogada, inapelavelmente, pela primeira escotilha disponível. Isso sem falar num “alien” chamado Calvin (  !  )... acho que vou correndo rever PERDIDO EM MARTE e INTERESTELAR.

quinta-feira, 4 de janeiro de 2018

3013 - BLACK MIRROR - TEMPORADA 1

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Uma nova visão da tecnologia (Nova...???)
BLACK MIRROR - TEMPORADA 1 - (BLACK MIRROR, UK, 2011) – Onde eu estava que ainda não tinha assistido a esta excepcional produção britânica repleta de criatividade e temas instigantes? A torrente de boas séries na TV tem este efeito colateral: o dia ainda tem apenas 24 horas, e não dá tempo para acompanhar tudo ao mesmo tempo (que é mais um motivo para a nossa cota de estresse pós-moderno). Quando começamos a ver, sobrevém aquela conhecida sensação de que já devíamos ter começado e que o indesculpável adiamento só faz aumentar a culpa por não ter priorizado este que é, certamente, um dos melhores programas no ar atualmente, juntamente com STRANGER THINGS, que comentarei oportunamente. BLACK MIRROR não é realidade alternativa – é realidade extrema. É uma série em formato de antologia: cada episódio é uma história completa, com seu próprio elenco e seu próprio universo. Todos eles, porém, têm em comum algo fundamental: passam-se em um futuro próximo que é uma versão acentuada, ou extrema, do nosso presente. Charlie Brooker, o insanamente criativo responsável por esta iguaria, é particularmente interessado com a obsessão com informação, conectividade, compartilhamento, renúncia à privacidade, exposição da intimidade alheia e todas as incalculáveis implicações da incorporação da tecnologia à vida pessoal em tão alto grau e, quase sempre, de forma deletéria. A questão nodal dos roteiros reflete o fato de que a tecnologia pode evoluir e melhorar a sua vida, mas a natureza do homem não muda e, em boa medida, seus defeitos e fraquezas podem inclusive ser amplificados de forma exponencial por ela. BLACK MIRROR é quase sempre é comparada a Twilight Zone, a clássica antologia de ficção científica criada por Rod Serling entre 1959 e 1964. Mas há um elemento disruptivo importante entre elas: Serling era um arauto brilhante que dava um tratamento admoestativo aos seus episódios. Já Charlie Brooker aborda suas histórias sempre com o tom de um participante da cultura sobre a qual ele está especulando; ele não é um forasteiro que, de fora, alerta sobre os perigos de um estilo de vida perpassado por uma obsessão patológica pela tecnologia, mas sim alguém que, de dentro, pergunta-se se seria possível corrigir sua rota. É recorrente no DNA de BM o fato de a mesma escolha se imponha aos protagonistas: ceder ao fluxo viciante da onda tecnológica ou, de alguma forma, tentar resistir. De certa forma, a sensação final é sempre a mesma: a percepção de que o esvaziamento existencial é inevitável, assim como a destruição lenta, gradual e irreversível das relações interpessoais. A partir daí, BM se transforma, em certos momentos, numa discussão “hobbesiana” sobre os efeitos insalubres das implicações pervertidas da tecnologia na nossa vida cotidiana. É o que mostra o primeiro episódio desta temporada de estreia: o Primeiro-Ministro britânico se vê obrigado a aceitar a obscena e doentia exigência do sequestrador da princesinha da nação, por causa, principalmente da reverberação política e pessoal que tal ato está tendo nas redes sociais e no Youtube. No segundo, numa sociedade em que o indivíduo tem que pedalar para conseguir créditos que compram pequenos prazeres e necessidades pessoais (como alimentar-se, por exemplo), um programa de TV, ao estilo de THE VOICE, transforma a iniciativa crítica de um espectador solitário em ferramenta para sua própria perpetuação. No terceiro, um chip implantado na cabeça das pessoas permite que passem suas lembranças numa tela, para que todos possam ver e nenhum segredo sobreviva a este extermínio da privacidade. Tudo junto e misturado, BM é coisa de gênio. A propósito, BLACK MIRROR se refere ao efeito de uma tela de TV ou de computador quando desligada, deixando um reflexo obscurecido de quem está diante dela. Tudo a ver, Maurício.